Anime e música sempre andaram lado a lado. O uso de cantores famosos na dublagem ou de dubladores como cantores é uma prática muito comum para popularizar uma série. Seria então natural que, em algum momento, surgissem animes sobre música. E um dos melhores — se não O melhor — a lidar com o tema é o assunto de hoje: BECK: Mongolian Chop Squad.

Adaptação do mangá de Harold Sakuishi (cujo verdadeiro nome é Takahiro Sakuishi), a história segue Yukio Tanaka, o Koyuki, um adolescente apático que, um dia, conhece Ryuusuke Minami, um guitarrista em busca de fama no mundo do rock. Logo, Koyuki se vê envolvido com o sonho de Ryuusuke ao mesmo tempo em que tem de lidar com problemas de escola, família e um relacionamento complicado com a irmã de Ryuusuke, Maho.

Sendo um anime do famoso estúdio Madhouse (Trigun, Death Note, Paprika), é normal esperar uma qualidade técnica impecável. E mais uma vez a casa louca não decepciona.

As cenas dos concertos são animadas em CG Cell Shaded (mesma técnica usada em jogos como Tales of Vesperia e Kingdom Hearts para dar um feel de anime aos gráficos) e se misturam bem ao visual simples e limpo dos cenários e personagens.

O fechamento, totalmente formado por slides de bandas famosas, é muito original e carrega toda a essência da série. Há alguns momentos em que há apenas um zoom numa personagem enquanto ele não fala nada, o que pode se tornar irritante.

O roteiro é bem amarrado e brilha com suas personagens bem escritas. Todos que já tentaram montar uma banda sabem como Koyuki se sente ao ter de escolher entre a música e os estudos. Os conflitos internos dele são os de qualquer outro adolescente na mesma situação e isso é o grande trunfo de BECK: é fácil se identificar com os protagonistas.

Todos os integrantes da banda possuem uma química muito boa entre eles tornando difícil alguém não torcer pelos desajustados que tentam fazer música sem se vender às exigências da indústria, especialmente para aqueles que entendem o que a banda está dizendo.

BECK é como um grito rebelde contra as boy bands e idols que dominam o mercado fonográfico atual — em especial o japonês. O vocalista, Chiba, não é um garoto bonito e bem comportado com um hamster, mas um sujeito briguento e burro à margem da sociedade organizada japonesa, alguém que simplesmente não se encaixa nos moldes normais.

Koyuki, o único que poderia ser considerado socialmente aceitável, pouco a pouco se afasta da escola para viver o sonho da banda. A jornada do grupo, que sacrifica cada vez mais seu tempo em nome do sonho de fama, é algo que vai contra as crenças da sociedade japonesa. Ir contra a corrente e fazer aquilo que se quer, mesmo que todo o mundo esteja contra você. Isso é BECK.

Claro que, falando de uma série sobre música, a trilha sonora não podia deixar a desejar. Há muitas insert songs durante o decorrer da mesma, muitas interpretadas pela banda BEAT CRUSADERS (que também fez a quarta abertura de Bleach, a divertida “Tonight, Tonight, Tonight”).

Há diversas referências a artistas reais na série como Ramones, Rage Against The Machine, Bob Marley, Nirvana e por aí vai. E é interessante notar que, novamente, BECK homenageia aqueles que ousaram ir contra aquilo que era normal para seu tempo (apesar disso ser discutível sobre os Beatles, mas não entremos no mérito da questão).

A abertura, HIT IN THE USA, é uma verdadeira ode ao sonho do sucesso internacional que vive no coração de cada artista. Vale notar que foi exatamente HIT IN THE USA que permitiu aos BEAT CRUSADERS se tornarem amplamente conhecidos.

No Japão, tanto o anime quanto o mangá foram um sucesso considerável. O último volume do mangá ficou entre os dez mais vendidos em sua semana de lançamento e o anime rendeu diversos produtos licenciados, entre eles duas guitarras lançadas pela Fender Japan, e uma adaptação em Live Action que estreou em 2010.

Fora da terra dos samurais, a série também conquistou uma legião de fãs, sendo considerado por muitos o melhor anime sobre música já feito (fãs que me perdoem, mas K-ON é sobre música como Evangelion é sobre lutas de robôs gigantes).

A crítica em geral foi muito positiva para o anime, citando o ritmo quase perfeito e a execução fenomenal como as maiores qualidades. No Brasil, BECK é conhecido apenas pelos DVDs de “divulgação” vendidos em eventos de animes e pelas versões dos fansubs, o que é estranho considerando a popularidade da série no exterior.

BECK deve ser assistido por todos os fãs de anime, de música ou por aqueles que simplesmente gostem de uma boa história sobre sonhos e as dificuldades em realizá-los.

Título: BECK: Mongolian Chop Squad
Estúdio: Madhouse
Direção: Osamu Kobayashi
Número de Episódios: 26