Antes de começar a falar sobre o mangá quero avisar que esta é a minha primeira resenha para o site em se tratando de quadrinhos. Esse trabalho sempre ficou a cargo da Allena e do Kuroi e ambos são bem entendidos do assunto, não há dúvidas.

Este que vos escreve talvez não tenha tanto conhecimento técnico sobre o que é editar um mangá e isso talvez me coloque na posição de um “leitor normal”: aquele que não vê tantos defeitos nas versões nacionais das amadas obras japonesas e por isso muitas vezes acha exagerado algumas críticas feitas por fãs mais “hardcore”.

Um outro aviso: como já sabem, o mangá a ser resenhado fala sobre o budismo, filosofia oriental bastante difundida pelo mundo afora, mas tenho que admitir não conhecer praticamente nada sobre o mesmo. Com isso, não sei se me torno apto a falar de uma obra sobre o tema, mas mesmo assim irei encarar tal desafio, até porque o que estará em questão é o mangá como um todo e não a crença a qual ele serve.

Dado os recados, vamos começar o trabalho.

O mangá
A História de Buda em Mangá é uma obra de volume único que saiu no Japão pela Ichimannendo e é a primeira publicação da Satry, que representará a editora japonesa em nosso país. Como já divulgado anteriormente, a Satry se focará em publicações que tenham como base a filosofia japonesa, e nada melhor que começar com uma biografia de alguém tão importante para o oriente de forma geral.

A edição foi lançada nas livrarias e lojas especializadas no final de março à R$ 21,00. O valor a princípio pode desencorajar a aquisição da obra por parte de muitos por estar bem acima do que é cobrado por outras editoras. Mas, será que vale a pena pagar esse preço? O que o título tem de especial? Vamos por partes…

O autor
O mangá é de autoria de Hisashi Ohta, que publicou outras obras no mesmo estilo pela própria Ichimannendo, entre elas Introdução ao Budimo. Nascido na provincia de Shimane em 1970 cursou a universidade de Biologia Molecular e posteriormente formou-se na escola de animação Yoyogi.

A História
Há mais de 2600 anos nasceu no Reino de Kapilavastu, na fronteira no que hoje é a região entre a Índia e o Nepal, o Príncipe Sidarta Gautama. Com sua condição de realeza, Sidarta tinha tudo o que queria, mas de alguma forma isso não o deixava feliz, tinha a necessidade de entender o sentido da vida.

Observando os moradores de seu reino, o príncipe sente-se incomodado pela idéia da morte, da doença, da velhice. É como se tivesse por dentro um grande vazio.

Seu pai, o Rei Sudodana, preocupado com o filho que mais cedo ou mais tarde ocupará o seu lugar, trata de tentar fazer com que o jovem sinta-se mais feliz. Para isso, arranja um casamento com uma bela mulher e posteriormente até mesmo um “harém” para que o príncipe esqueça tais preocupações e mergulhe no que ele considera “felicidade momentânea”. Em vão.

Sidarta então decide deixar a riqueza, a mulher, o filho, a família e tudo mais para se tornar um asceta e parte para as montanhas para se isolar do mundo e tentar encontrar a iluminação, ou a verdadeira felicidade, através da meditação.

Impressões
Definitivamente, A História de Buda em Mangá não é uma obra que irá agradar a grande parte dos leitores acostumados com os títulos tradicionais lançados por aqui. Na realidade ele é feito justamente para quem não tem o costume de ler esse tipo de quadrinho, para o público “normal”.

A premissa de contar a trajetória do Príncipe Sidarta até ele se transformar em Buda já rendeu histórias muito interessantes, mas não é o caso. Sidarta passa o tempo todo vendo o sofrimento das pessoas a sua volta e filosofando o sentido da vida. Nada está bom e ele tenta buscar a felicidade plena, aquela que não está nas coisas desse mundo.

E é este o problema: o personagem se torna antipático e por diversos momentos você quer parar de ler, uma vez que nada acontece e não há nenhum climax que o faça querer avançar na trama. No final tem-se a impressão que na verdade a obra é uma espécie de “cartilha” institucional – tipo aquelas que falam pras crianças da importância de não se desperdiçar água ou os perigos de brincar com a eletricidade.

Se havia o objetivo de despertar nos leigos o interesse pelo budismo acredito que dificilmente conseguirá, uma vez que o tempo todo a obra passa apenas a mensagem de que a existência humana é sem sentido é que é necessário deixar tudo deste mundo para trás e assim descobrir a verdadeira felicidade. É como se houvesse algo errado em viver.

Como disse no início deste texto, não tenho conhecimento sobre a filosofia do budismo, mas admito que o mangá me fez ter menos vontade ainda de conhecer. Sidarta passa o tempo todo chateado com tudo e no final atinge a felicidade apenas através da meditação – de uma forma meio simplista demais. Durante toda a história ele diz que riqueza, prazer, diversão, arte e outras coisas dão apenas satisfação momentânea mas não a felicidade plena – que é conseguida apenas através da “iluminação”.

Ao ler tive a impressão de que a mensagem que estava sendo passada era que essas coisas não deveriam existir e o ser humano deveria buscar algo que estaria além da vida. Em todo momento sempre me veio a cabeça: ” Não seriam essas pequenas coisas momentâneas que tornam nossa vida mais interessante?”.

É lógico que a filosofia do budismo vai bem mais além do que é mostrado no mangá, isso não se discute. Mas olhando a obra por cima cria-se uma ideia um pouco simplista demais sobre o assunto. Lembrando que trata-se de uma biografia, não é um material de cunho religioso.

A versão nacional
Não há muito a se reclamar do material produzido pela… JBC! Sim, o projeto gráfico ficou a cargo da editora mais polêmica que mamilos. Só que a qualidade do material está a anos luz à frente em relação ao que a equipe do MDG produz – e o preço já nos indica isso.

O mangá possui o formato 13,5 x 20,5cm (a mesma medida de One Piece da Panini, por exemplo), 243 páginas e capa cartonada, com direito à orelhas. O papel utilizado é o mesmo que costumamos a ver em edições normais, mas com folhas não tão finas. Apesar disso, é possível se enchergar transparências nas páginas.

Quanto à impressão não há o que reclamar: o mangá é realmente preto, nada de cinza disfarçado. O fato de ser todo costurado demonstra o capricho que a editora teve com o material.

A tradução de José Rubens Siqueira está ok. Não há erros de português e o texto flui naturalmente. Também foram usadas fontes diversas (não muitas), pra alegria dos que reparam nesses detalhes.

A arte da capa é bem interessante e combina bastante com o tema da obra. Só não ficou muito legal colocar Sidarta e a Princesa Yasodhara na parte superior e inferior respectivamente. Deveriam ter deixado apenas a silhueta dele na figueira, tornando assim a capa menos poluída.

Considerações Finais
Se vale a pena adquirir A História de Buda em Mangá? Apesar da dura crítica em relação ao desenvolvimento da história, particularmente acredito que sim, vale a pena levar pra casa o material, não apenas pela edição bem acabada da editora Satry, mas pra visualizar um outro aspecto dos quadrinhos (japoneses ou não): serem capazes de passar mensagens e ensinamentos de forma eficaz tanto quanto livros e manuais.

Além disso, é sempre bom conhecer a história de pessoas que influenciaram todo o mundo. E é o caso de Sidarta Gautama.

Ficha Técnica
Título:
A História de Buda em Mangá
Autor:
Hisashi Ohta
Formato: 
13,5 x 20,5, 243 páginas
Duração:
Volume Único
Preço: 
R$21,00
Demográfico: 
Seinen