No último domingo, 31 de janeiro, a NewPOP anunciou o relançamento de Cavaleiros do Zodíaco: Episódio G, publicado por aqui pela primeira vez por meio da editora Conrad, entre 2004 e 2015. No Japão, a obra foi lançada no ano de 2002 e concluída em 2013.

O anúncio pegou todos de surpresa, afinal, a expectativa dos fãs sempre foi uma reedição pela JBC, até então a “casa” dos guerreiros de Atena no Brasil (depois da série deixar a Conrad). Independente da editora, já era hora da série dar as caras por aqui de novo – e não só porque spin-offs mais recentes, como Lost Canvas, já tiveram uma nova edição.

Goste ou não da trama, é inegável que Episódio G marca a franquia de Cavaleiros no Japão e no Brasil por diversos ângulos. Vejamos um pouco mais da importância deste spin-off, que foi brevemente comentada durante a live de anúncio por Junior Fonseca e Eduardo Vilarinho.


Um Mundo Cheio de Luz

Imagem: Aiolia no 'Episódio G'.

Aiolia/Aioria em sua juventude, quando pintava o cabelo de vermelho… | Divulgação: Akita Shoten.

O primeiro grande marco da saga G é, bem, o autor: foi a primeira vez que um mangá de Saint Seiya foi publicado sem o traço e o roteiro do autor original, Masami Kurumada – embora os autores de spin-off todos digam que Kurumada se envolve pelo menos na concepção do projeto.

Não é o primeiro spin-off com história de outro autor: a novel Gigantomaquia, cujo 1º livro saiu no Japão em 23 de agosto de 2002, escrita por Tatsuya Hamazaki é quem leva esse mérito – desconsiderando as curtas histórias laterais publicadas em edições especiais da Shonen Jump ainda nos anos 1980, de autoria desconhecida.

Imagem: Capa brasileira do 2º volume de 'Gigantomaquia', com a jaqueta.

Divulgação: Conrad.

Gigantomaquia é completa em 2 livros. Um publicado em agosto e o outro em dezembro de 2002.

A trama mostra a luta dos cavaleiros de bronze clássicos contra os Gigas (Gigantes) e o deus Tífon (Tifão), além da chegada de um personagem novo, o Mei. A Conrad trouxe a novel para cá entre 2004 e 2005.

Enfim, Episódio G também trouxe algo que muitos fãs queriam ver há tempos: um foco maior nos cavaleiros de ouro.

Ambientado entre a fuga de Aiolos e o início da série clássica, a trama traz os guerreiros dourados lutando contra os Titãs (aqueles da mitologia grega), com Aiolia/Aioria de Leão como protagonista.

Apesar de não ser o primeiro spin-off “fora das mãos de Kurumada”, foi o primeiro mangá seriado por outro autor, Megumu Okada. Mas não é só isso. A obra marca ainda a entrada de Cavaleiros em uma outra editora no Japão: a Akita Shoten.

Como é de conhecimento público, Saint Seiya foi publicado do final de 1985 a 1990, rendendo 28 volumes, na famosa revista Shonen Jump, da editora Shueisha. Até G, toda mídia impressa da série – livros especiais, enciclopédias e até a novel citada – ficava a cargo da Shueisha, que, até onde se sabe, teria algum tipo de direito ou licença sobre a marca.

Mas a entrada da série na Akita Shoten não foi um rompimento com a primeira editora (ou, pelo menos, não até o momento). A Shueisha seguiu tendo os direitos que lhe cabiam sobre a série de Saint Seiya que ela publicou, apenas não possui nada com relação à “marca” Saint Seiya: Episode G – esta última, portanto, é da Akita Shoten.

Apesar de participarem do mesmo “universo fictício”, elas não são exatamente a mesma coisa do ponto de vista comercial. O autor de Saint Seiya é Masami Kurumada e se ele assinou, lá na década de 1980, um contrato com a Shueisha sem comprometer eventuais derivados de seu trabalho – ou seja, sem a obrigação de publicar histórias adicionais pela editora – ele poderia permitir um spin-off saindo por outro meio.

Bem, como foi isso que aconteceu, presume-se que o contrato assinado na época seja específico para a história original de Saint Seiya.

Naquela altura, talvez isso não fizesse parte de nenhum “plano” de Kurumada, mas Episódio G marca o início de uma “nova era” na franquia: a partir dali, todas as novas obras impressas da série sairiam pelo editora Akita Shoten – quer dizer, todas, exceto a adaptação em mangá de Ômega, que saiu pela Kadokawa, mas não demorou muito a ser cancelada. Mas Ômega é originalmente uma animação da Toei, é possível que a negociação do mangá nem tenha tido envolvimento direto do Kurumada.

Imagem: Capa do 12º volume japonês de 'CDZ: Next Dimension'.

O 13º cavaleiro de ouro em toda a sua magnanimidade… ou algo assim. | Divulgação: Akita Shoten.

A “migração” poderia ser considerada completa quando o próprio Kurumada começa a publicar Next Dimension, a continuação da história original, pela editora lá em 2006.

De lá para cá, várias novidades vieram. Lost Canvas, Saintia Shô, G: Assassin, G: Requiem e até o isekai Dark Wing, tudo saindo pela Akita, a “nova casa” dos derivados em mangá da franquia. Há quem sonhe que exista algum “grande projeto” por trás disso (eu já não tenho tanta esperança).

A Akita tanto se tornou a nova casa da série que até está para lançar uma “edição definitiva” do mangá clássico, a Saint Seiya: Final Edition. Essa aqui deixou todo mundo com um pulga atrás da orelha. Afinal, até onde se sabia, a dona desse pedaço da série deveria ser a Shueisha. Há um tempo nós tentamos, sem muito sucesso, entender quem exatamente possui os direitos da série atualmente.

Seja como for, no Japão, Episódio G é um marco: foi o pontapé da mudança de editora da franquia, além de ter sido a porta para os spin-offs de outros mangakás. Na época, tratava-se de uma grande novidade, mas a série acabou, com o tempo, um tanto “eclipsada” pelo brilho de Lost Canvas.

Com duas propostas diferentes e feitas por mãos distintas, é um pouco complicado compará-las narrativamente. Mas existem dois fatores importantes no “boom” de Lost Canvas a serem considerados: o primeiro deles é o “tamanho” da revista.

Episódio G começou na Champion RED, uma revista mensal (na época, shounen), já a série de Shiori Teshirogi foi publicada semanalmente de 2006 a 2011 em um dos carros-chefes da Akita, a Shonen Champion, onde também está o Next Dimension. A tendência de uma série com maior visibilidade é de atingir maior público e, com isso, fazer mais barulho.

Imagem: Ilustração de Yato, Tenma e Yuzurih0, de 'CDZ: Lost Canvas' a feita por Shiori Teshirogi.

Reprodução: Shiori Teshirogi.

O segundo ponto, que se relaciona com o primeiro, é a periodicidade. Séries semanais tendem a ter mais público que séries mensais.

Para complicar mais, Episódio G passou por um revés: em 2009, a obra entrou em hiato, supostamente por desavenças entre Okada e a editora – até hoje, ninguém sabe exatamente o que aconteceu.

A obra voltou em 2011, dessa vez na Champion RED Ichigo (também shounen, nessa época a RED original estava no processo de “seinenficação” da revista), e foi concluída em 2013. Um hiato de 2 anos pode atrapalhar bastante a performance de uma série.

Apesar de Lost Canvas ter “roubado a cena”, muito provavelmente todos os spin-offs vieram na esteira do sucesso de G.

Não só isso: o mangá foi comercialmente interessante o suficiente para a Akita deixar Okada produzir sequências.

Com isso, de 2014 a 2019, o autor publicou Episode G: Assassin, com 16 volumes, e publica, desde 2020, Episode G: Requiem, ainda sem nenhum encadernado. Ao contrário do G original, que serve como um “prólogo” à série clássica, esses dois se passam no futuro, quando a linha do tempo fica toda bagunçada e um cenário apocalíptico chega.

Para entender melhor a extensa cronologia da série, você pode checar esta coluna.

E no Brasil?

Se já não bastasse a importância da obra dentro da franquia num geral, Episódio G também é importante para o mercado brasileiro. Seria seguro dizer que foi dos primeiros lançamentos de mangá com páginas coloridas e acabamento mais caprichado por aqui – ele era meio caro perto do preço médio na época.

Além disso, foi das primeiras obras a chegar de forma mais “simultânea” em relação ao Japão, com a publicação nacional se iniciando com a série ainda em andamento e com poucos volumes no país de origem.

Imagem: Capa japonesa do volume 19 de 'Episódio G'.

A nacional vale mais do que dinheiro… | Divulgação: Akita Shoten.

Infelizmente, a aposta acabou custando caro. A editora Conrad entrou em crise durante a publicação do mangá, ele ficou anos parado. No ano em que a série entrou em hiato no Japão, a editora foi comprada pela IBEP.

Em 2011, no retorno do hiato no Japão, a Conrad estava já cancelando alguns mangás de peso, como One Piece e Dragon Ball.

No meio dessa bagunça, a editora ainda se esforçou para honrar seus compromissos com Cavaleiros e terminou a publicação de Episódio G em 2015, em tiragens limitadas, sofrendo ainda um contratempo:  no lançamento do 19º volume (o penúltimo), em 2013, um caminhão da distribuidora foi assaltado a caminho do Rio de Janeiro e, com isso, ele virou uma espécie de “material raro”.

É possível que o azar da obra por aqui tenha deixado a editora japonesa reticente em ceder novamente os direitos de publicação.

Mas já era hora de alguém de conseguir negociá-lo. Episódio G merece voltar ao Brasil, desta vez espera-se que com o volume 0 incluso — um número especial, publicado no Japão, contendo uma história sobre Aiolos e materiais enciclopédicos (a Conrad até tentou, mas não conseguiu os direitos).

Assim como a série clássica e Lost Canvas têm espaço para uma republicação em formato de luxo, Episódio G também possui peso o suficiente para voltar em versão caprichada e “completa”.

Novas Portas?

Assim como a série marcou a “saída” de Saint Seiya da Shueisha, aqui no Brasil agora ela marca a primeira vez que a franquia vem para o Brasil fora da JBC, que era, até então, a “herdeira” da Conrad.

Talvez seja um evento pontual, mas certamente muitos fãs já estão torcendo para a NewPOP anunciar as continuações, G Assassin e G Requiem. Claro, tudo dependeria do sucesso da republicação e também da editora japonesa.

Há casos lá fora em que uma série é licenciada para uma editora e sua continuação é licenciada para outra. Basicamente, abre-se a possibilidade de que qualquer editora poderia anunciar qualquer coisa de Cavaleiros, a qualquer hora.

Imagem: Capa de 'Golden Age'.

A capa de ‘Golden Age’. | Divulgação: Akita Shoten.

Eu particularmente gostaria de ver as novels de Cavaleiros por aqui. A Akita lançou uma, Golden Age, como brinde da Champion RED, lá em 2016.

Não sei se esse tipo de material sequer fica disponível para ser licenciado fora do Japão, mas o sonho de fã sempre fica.

A outra novel é a já citada Gigantomaquia. Do lançamento nos anos 2000 para cá, o livro já virou artigo raro. Mas aqui, como disse anteriormente, estamos falando de negociações com a Shueisha, seria um caminho diferente. A Enciclopédia já penso ser sonhar demais mesmo.

Sinceramente, o novo mangá, Dark Wing, talvez seja um título pelo qual a NewPOP tente brigar – acho pouco provável que a JBC não tente.

Como começa com uma proposta mais “diferentona” do padrão da série (é um isekai!), acho que até combinaria com o portifólio da NewPOP.

Seja como for, já era hora de ver Episódio G de volta, por tudo que ele representa… E quem sabe, por tudo que ainda pode representar.


O texto presente nesta coluna é de responsabilidade de seu autor e não reflete necessariamente a opinião do site JBox.


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