Quem me acompanha desde a antiga versão do meu blog (lá no Blogspot) sabe que sempre apoiei séries e filmes em serviços de streaming, especialmente de tokusatsu. Lá nos idos de 2014 pra 2015, eu era minoria. Quase sempre que eu argumentava, apareciam vários fãs enaltecendo a pirataria, achavam que só a TV aberta funcionava (mesmo sem exibições de uma produção do gênero) e até chamavam tais plataformas de “fansubs de luxo”. Sempre havia uma desculpa.

No começo, era difícil conscientizar o público. Felizmente, descobri que eu não estava sozinho. Produtores de conteúdo como Danilo Modolo e Raphael Maiffre, dos canais TokuDoc e Mega Power Brasil, respectivamente, também entendiam a importância de termos séries de Ultraman na Crunchyroll ou mesmo de temporadas de Power Rangers na Netflix. Pois as visualizações geram números (entenda: audiência) tanto para as plataformas quanto para as distribuidoras.

Ah, vale lembrar que o site JBox foi um dos veículos essenciais para a valorização do streaming no Brasil.

A verdade é que esse tipo de mídia veio pra ficar. Hoje é possível encontrar títulos pra todos os gostos. Grandes sucessos do cinema, séries do momento, documentários, musicais especiais, etc. Os amantes da cultura pop japonesa podem escolher entre animês com exibição (quase) simultânea com o Japão e até mesmo assistir clássicos como Mazinger Z, Gundam e Os Cavaleiros do Zodíaco.

Porém, o tokusatsu tem seus altos e baixos até aqui. Vamos por partes.


Fase experimental

Imagem: Rangers vermelhos de diversas gerações de 'Power Rangers'.

Tudo começou com uma invasão de Power Rangers | Foto: Divulgação/Hasbro

Meses depois da chegada da Netflix ao Brasil, tivemos um pacotão com todas as temporadas de Power Rangers (de Mighty Morphin até Samurai), além de séries derivadas como VR Troopers e Beetleborgs, adicionadas ao longo de 2012.

Tá, você pode dizer que “ah, Power Rangers não é tokusatsu”. Ledo engano, meu caro Padawan. Isso é assunto pra outra coluna, mas é tokusatsu sim. Aliás, não é errado consideramos que os heróis multicoloridos da Terra do Tio Sam foram os pioneiros do gênero via streaming. Mas essa mídia ainda era novidade e nem todo mundo ainda tinha acesso ou interesse como hoje.

Só que a ascensão do streaming não demorou para acontecer. No final do mesmo ano, a Crunchyroll chegou ao Brasil, já com um segmento voltado para o público otaku, com animês em simulcast. Lembro que havia uma resistência de uma parte que não estava nem aí se a pirataria ia prejudicar ou não sua série favorita.

Acredite se quiser: o mesmo aconteceu no fandom de tokusatsu. Quando Ultraman Leo, Ultraman 80 (Eighty), Ultraman Max e Ultraman Mebius foram lançados pela plataforma, tinha fã que torcia mesmo o nariz e sempre dava uma desculpa marota como “tá legendado”, “só assisto se for dublado e se tiver na TV aberta”, e coisas do tipo.

Imagem: O Jaspion.

Jaspion e cia no streaming! A notícia saiu primeiro aqui no JBox | Foto: Divulgação/Toei

Era difícil abrir a mente do público. Só que, em 25 de maio de 2015 veio a notícia (publicada com exclusividade aqui no JBox) da aquisição de Jaspion, Changeman, Flashman, Jiraiya, Jiban, National Kid e o então inédito Garo pela Sato Company. A promessa era lançar esses títulos na Netflix. Mas não vingou justamente pela qualidade de imagem dos clássicos. O resto disso é história.

Essa expectativa acabou se tornando um mal necessário. A grande maioria do fandom foi entendendo com o tempo a importância desse tipo de conteúdo. Era necessário consumir e aproveitar os materiais para que outros títulos fossem licenciados no Brasil.

Tudo era muito experimental. Tanto é que a Sato Company acabou criando sua própria plataforma de streaming. Nunca cheguei a assinar o Wow! Play, mas acompanhei os relatos de assinantes que sempre reclamavam de problemas técnicos. O serviço durou apenas 8 meses, consequência de uma estratégia feita às pressas.

Em 2016, Sato acabou criando o canal oficial Tokusatsu TV no YouTube. Claro que a ideia era bem vinda e agradou bastante os saudosistas. Mas era estranha a divisão de episódios em 3 partes, grade de lançamentos que mudava de horário e sofria pausas e coisas do tipo.

Pra piorar, o canal saiu do ar por problemas com direitos autorais. Mas esse mal entendido foi resolvido em poucas semanas com a mediação da própria Toei. Rolou uns relançamentos de episódios, desta vez em versão integral. Por algum motivo (que eu não me recordo), as séries ficaram incompletas por lá.


Evolução

Imagem: O Ultraman X.

Ultraman X foi a primeira série tokusatsu exibida em simulcast no Brasil | Foto: Divulgação/Tsuburaya

Nesse meio tempo, o tokusatsu passou a ter mais evidência nas plataformas. Em julho de 2015, Ultraman X estreou na Crunchyroll com apenas um hora de diferença do Japão (tomando o posto de Jiban, que era a série tokusatsu que estreou mais rápido no Brasil – com menos de um ano e faltando apenas seis dias para o episódio final no Japão), sendo o primeiro simulcast do gênero por aqui.

Em fevereiro de 2016, Ultraman Gaia e Ultraman Nexus foram lançados pela Crunchyroll – porém, apenas com legendas em inglês. Em abril do mesmo ano, Ultraseven X estreou na Netflix e com dublagem. Outros simulcasts vieram em julho de 2016 e julho de 2017 com Ultraman Orb e Ultraman Geed, respectivamente.

Na época, tinha filmes de Ultraman e Garo na Netflix e também animês derivados como Kaiju Girls (2016) e Garo – Vanishing Line (2017) na Crunchyroll.

Antes da atual fase global, o canal oficial da Tsuburaya, que atendia pelo nome Ultra Channel, exibia diariamente os clássicos Redman (1972), Triple Fighter (1972) e Ultra Fight (1970~71). E o Godzilla Channel exibia de diariamente o Godzilla Island.

Na época, incluindo Power Rangers, tínhamos cerca de 50 títulos de tokusatsu. Cheguei a fazer uma lista no meu antigo blog com os títulos que estavam disponíveis na ocasião. Por mais que alguns não reconhecessem, o streaming já era algo que estava se tornando indispensável para a maioria.


Virou rotina

Imagem: Os Power Rangers de Dino Super Charge.

Os primeiros episódios de Power Rangers Dino Super Charge estão no YouTube | Foto: Divulgação/Hasbro

É claro que boa parte dos títulos citados acima já não estão mais disponíveis. Contratos expiram e uma renovação depende de audiência e até mesmo interesse das distribuidoras em continuar investindo. Por isso a importância de valorizar sua série favorita quando estiver em algum catálogo.

Neste mês perdemos grande parte de Power Rangers na Netflix. Em compensação, teremos todas as temporadas expiradas de volta, gradualmente, no YouTube. E os primeiros passos já estão sendo dados com o lançamento de Power Rangers Dino Super Charge em português.

Ainda é possível encontrar filmes de Godzilla, incluindo a trilogia animada. Em abril teremos o animê Godzilla Singular Point.

Imagem: Kamen Rider Black lutando contra um inimigo.

Kamen Rider Black está disponível no Prime Video | Foto: Divulgação/Toei

A tríade Jaspion, Changeman e Flashman, a série original de Garo e alguns de seus filmes, Ultraman Orb, Kamen Rider Black, Kamen Rider Amazons (Amazon Riders) e Kamen Rider Zi-O estão no Amazon Prime Video.

Na Crunchyroll, ainda é possível assistir algumas séries Ultraman. A Funimation também possui o animê SSSS.Gridman, o primeiro do universo de Gridman.

O canal da Tsuburaya no YouTube evoluiu com exibições de antigas séries de Ultraman (das eras Showa e Heisei) e o clássico Gridman (1993). As exibições semanais das séries vigentes são tradição desde a época do Ultra Channel. O diferencial é que desde o ano passado, com Ultraman Z (Zett), as legendas em inglês estão presentes. E as minissérie de Ultra Galaxy Fight (New Generation Heroes e The Absolute Conspiracy) se tornaram sucesso, tanto que está confirmada mais uma continuação.

Também no YouTube, temos o canal Toei Tokusatsu World Official, que diariamente lança episódios de clássicos das décadas de 60 a 90. A falta de legendas dos episódios 3 em diante de cada título ainda é um problema que deveria ser reavaliado pela Toei, mas a disponibilidade de séries raras é um peso importante. Atualmente, o canal tem lançado episódios selecionados de cada série Kamen Rider (sendo dois episódios de cada uma), em comemoração aos 50 anos da franquia.

Hoje, a grande maioria do fandom já aderiu o streaming. Tente fazer uma comparação do cenário de cinco anos atrás com o de hoje. A conclusão é que não dá mais pra consumir tokusatsu sem essa alternativa. É claro que essa mídia não anula a TV. Vejo como um complemento.

Imagem: Ultraman e Ultra-Seven.

Ultraman Z iniciou a expansão global dos heróis da Nebulosa M-78 | Foto: Divulgação/Tsuburaya

Um programa pode ter uma um número inexpressível na telinha e pode ser um fenômeno na internet. As séries mais recentes de Ultraman costumam ter média de 1% de audiência para a TV Tokyo. Só o primeiro episódio de Ultraman Z teve mais de 2 milhões e meio de visualizações no YouTube. Fez sucesso, conquistou vários fãs de tokusatsu (amantes ou não da franquia) e até ganhou uma reprise no canal recentemente, com episódios relançados nas noites de sábado.

O streaming veio pra ficar. E não dá mais pra desdenhar/subestimar sua praticidade. Anos atrás, vários produtores de conteúdo (eu me incluo entre eles) já diziam que esse seria o futuro do tokusatsu no Brasil. Isso se concretizou, assim como também em outros segmentos da cultura pop. A tendência é melhorar e evoluir. Parte disso depende também do tratamentos das distribuidoras.

No mais, assim como não conseguimos conviver sem internet, os fãs estão mais perto de materiais legalizados de tokusatsu graças à essa ferramenta. A combinação é inseparável e o caminho é sem volta.


O texto presente nesta coluna é de responsabilidade de seu autor e não reflete necessariamente a opinião do site JBox.