Sabikui Bisco é um bicho diferente entre os pares na atualidade. Sem se apoiar sobre a muleta de uma grande franquia ou de fórmulas já batidas de isekai, o animê entrega uma aventura “à moda antiga” deliciosa de assistir.

Aspas no “à moda antiga”, pois, claro, novos animês de ação aventurescos, com elementos de fantasia, que não são continuações de franquias já estabelecidas ou isekais continuam sendo feitos. Nessa mesma última temporada de inverno no Japão, tivemos o péssimo Orient, e um dos grandes títulos do ano passado, Ranking of Kings, também pode entrar nessa, dentre outros.

Mas é como se a moda agora fosse outra. E tudo bem, pois ciclos são comuns em todos os meios artísticos da cultura pop. O trap é praticamente regra no pop mainstream dos Estados Unidos. E o cinema pipocão de Hollywood, nos últimos anos, tem investido mais e mais em filmes que adaptam personagens de histórias em quadrinhos e em continuações ou reboots de propriedades intelectuais que já deram certo antes. Há uma continuação de Top Gun prevista pras telonas no final de maio, por exemplo.

Imagem: Bisco pegando uma arma aparentemente congelada.

Reprodução: OZ/Crunchyroll.

E então, quando surge algo realmente bom, mas que não segue tanto o que está em alta, a experiência de assistir é bastante satisfatória. Porque há um ar de novidade, ainda que não seja.

Sabikui Bisco é o primeiro animê dirigido por Atsuki Ikariya, e é também a primeira produção do estúdio OZ. A trama se passa num Japão pós-apocalíptico coberto por uma poeira feita de ferrugem que corrói coisas e pessoas como uma doença. Nesse cenário, um arqueiro andarilho e um médico se juntam para encontrar um cogumelo que especulam ser capaz de curar a corrosão da ferrugem que está se espalhando.

Tematicamente e esteticamente, não há nada de realmente novo aqui. Histórias futuristas onde as coisas deram ruim e ocorrem paralelos visuais e o uso de arquétipos do cinema western já rolaram aos montes no universo animado nipônico. Vemos isso em Tringun, Samurai 7, Cannon Busters e outros.

Imagem: Personagem perto do cangote da outra, de forma meio amedrontadora (a personagem da frente está machucada e assustada).

Reprodução: OZ/Crunchyroll.

Ao por de lado esses elementos específicos e focar apenas no padrão de “uma turma de amigos viajando e enfrentando grandes perigos”, o leque de exemplos fica ainda maior. Entre as décadas de 1990 e 2000, algumas dezenas de animações nesse estilo fizeram sucesso.

Talvez se Sabikui Bisco tivesse saído nessa época, ele seria apenas um entre tantos. Mas estar posicionado em 2022, onde as modas são outras, lhe torna um espécime raro. Óbvio: nenhum senso de novidade por si só o faria ser bom – vide o já mencionado Orient, que foi péssimo.

Mas esse é um daqueles casos onde todos os pontos estão em seu lugar. O roteiro é muito bacana, mesclando passagens de tensão e humor conforme a história necessita, quase nunca se deixando levar por clichês narrativos de exposição. Os segmentos de ação, que quase sempre envolvem tomadas aéreas com flechas, monstros e cogumelos gigantes, são puro entretenimento bem dirigido.

Imagem: Garota de cabelo azul e Bisco.

Reprodução: OZ/Crunchyroll.

As ambientações urbanas imundas, invadidas pela poeira e ferrugem, descrevem bem o clima daquela sociedade. As piscadelas políticas são bem aplicadas. E os personagens são todos diferentes entre si, em design e personalidades, com tempos de tela em mini arcos que exploram o que de melhor eles podem oferecer para tocar a história pra frente.

A interação entre os dois protagonistas, Bisco e Milo, é um dos pontos altos do animê. Um é mais impulsivo, briguento, mas com grande coração. O outro é centrado, com pensamentos firmes, como se fosse a cabeça da dupla, mas não tem medo de demonstrar sua fragilidade. A cumplicidade deles é bonita, a amizade que eles constroem é contagiante, e a tensão sexual em alguns momentos adiciona ainda outra camada ao contexto todo.

Enfim, Sabikui Bisco é um grande animê da última temporada de inverno. Seria um título muito legal de assistir em qualquer momento que fosse lançado, mas num começo de década recheado de continuações e isekais bem parecidos entre si, ele se torna ainda mais especial por propor uma aventura onde podemos nos identificar e escapar do mundo real com o que é contato sem, de fato, colocar em tela um personagem que também está passando por isso em outro mundo.


Os 12 episódios de Sabikui Bisco estão disponíveis na Crunchyroll, com opção dublada em português ou em áudio original, com legendas.


O texto presente nesta resenha é de responsabilidade de seu autor e não reflete necessariamente a opinião do site JBox.