Sunny Sunny Ann! é uma história escrita e ilustrada pela mangaká Miki Yamamoto. Publicado entre 2011 e 2012 na revista Morning da editora Kodansha, o mangá é uma espécie de “road trip” que acompanha a protagonista Ann — uma mulher que viaja por aí com seu carro.

Dotada de um grande desejo por liberdade, Ann se recusa a morar em uma casa e trilha seu caminho buscando sua própria felicidade, que ela encontra em um modo não muito convencional de viver. Vencedor do Prêmio Cultural Osamu Tezuka em 2013, o mangá foi publicado no Brasil este ano pela JBC.

imagem: foto da capa de sunny sunny ann.

Foto: Andreza Silva/JBox.

Compilada em volume único, a história tem como fio condutor a própria protagonista, embora não tenha um enredo organizado em começo, meio e fim. Trata-se de um mangá quase episódico, embora também não se encaixe à risca nesse conceito.

As histórias não funcionam completamente de forma independente, sendo algumas delas contadas em dois capítulos, e existe uma correlação entre uma narrativa e outra. Entretanto, durante a leitura, a obra não passa a sensação de haver uma história maior formada pelo encadeamento de todos os capítulos. O que move o mangá é uma espécie de mote ou argumento, desenvolvido e exemplificado pelas aventuras da protagonista.

A parte mais atraente e interessante da obra é a própria Ann. A personalidade dela é um pouco curiosa: ela não almeja o que se espera que as pessoas normalmente almejem. O aconchego e a segurança de uma casa, criar raízes e viver pacificamente em um mesmo lugar… todas essas coisas parecem muito chatas para Ann. De certa forma, isso causa uma espécie de estranheza e leva o leitor a questionar um dito senso de “normalidade”. Afinal, por que todo mundo teria de querer viver do mesmo jeito?

imagem: foto de cena de ann em cima de seu carro.

Foto: Andreza Silva/JBox.

Ann tem um desejo intenso de liberdade e para ela liberdade é rodar por aí, sem um emprego ou uma moradia convencionais. Nesse sentido, a rejeição que ela faz desse modo de vida é também, até certo ponto, uma rejeição da ideia da mulher que deve estar “protegida” pelo espaço da casa e pela figura masculina do marido.

No que diz respeito à forma, Yamamoto faz um trabalho muito bacana. O traço da autora acompanha a personalidade ultralivre de Ann — as linhas dão a impressão de terem sido feitas com a mão solta, é displicente e desleixado. Mesmo os cenários nem sempre são feitos de maneira muito perfeccionista, principalmente os quadros onde aparece a protagonista são um pouco “bagunçados”: livres e indomáveis como a própria Ann.

Outro ponto positivo é que a obra apresenta personagens femininas em lugares bastante diferentes, podendo gerar uma reflexão bacana sobre a maneira que as mulheres, e como cada “tipo de mulher”, são enxergadas pela sociedade.

Entretanto, apesar de sua ânsia por liberdade e de sua maneira de levar a vida, Ann continua presa, de uma certa maneira, em um mundo que não comporta isso muito bem.

Ela ainda é perseguida e assediada pelos homens. Afinal, nem mesmo seu coração aventureiro é capaz de protegê-la num lugar em que, seja na estrada ou dentro de casa, as mulheres não têm suas escolhas individuais e seu corpo respeitados.

Muito do espírito de liberdade da Ann se configura não só no seu modo de viver, mas também na liberdade sexual que ela exerce. Além disso, a protagonista também apresenta uns ares um tanto desmedidos, uma coisa um pouco Medeia. Esse elemento é bem legal, por isso mesmo no momento em que ela demonstra uma postura “mais branda” em relação a um ato desses, acaba sendo meio decepcionante. Às vezes a raiva e o fogo são o que forjam uma boa heroína e é mais interessante manter assim até o fim.

No geral, o mangá é muito legal. Tem uma boa protagonista, um bom trabalho de articulação de forma e conteúdo e as histórias são bacanas.

imagem: foto de página do mangá.

Foto: Andreza Silva/JBox.

Ainda assim, em alguns momentos ele te faz pensar se não está chegando a hora de “superar” um pouco essa ideia de “história feminista” vir necessariamente atrelada a uma ideia de liberdade feminina transfigurada na questão da liberdade sexual. Não por razões moralistas ou porque a emancipação da mulher não perpasse por esse tema, mas porque falar em liberdade feminina vai muito além.

Às vezes, parece que estamos sempre rodando nesse tipo de temática e fazendo sempre as mesmas discussões. É claro que, por um lado, é importante continuar tratando de maneira contundente certos temas, já que as conquistas das mulheres se dão muito mais num plano discursivo.

Por outro lado, existem várias outras questões que precisam ser discutidas — como as condições de trabalho de alguns grupos de mulheres, a jornada dupla, a maternidade compulsória, a conciliação entre maternidade e trabalho, etc. — e elas tendem a aparecer menos ou de forma menos central nas obras de entretenimento que “se propõem a tratar da vivência feminina”.

Apesar disso, o saldo geral do mangá de Yamamoto é positivo. A obra tem muito mais qualidades do que “defeitos” e é uma boa pedida para momentos em que se deseja ler algo que vá além do puro entretenimento.


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Essa resenha foi feita com base em edição cedida como material de divulgação para a imprensa pela editora JBC. 


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