A frequente alta dos preços e o cada vez mais baixo poder de compra não são novidades para quem vive no Brasil. Salvo raríssimos momentos de estabilidade econômica, o consumidor brasileiro esteve sempre sujeito a uma oscilação constante do que se cobra nos produtos que compõem a sua rotina, seja ele da natureza que for (dos alimentos aos mais supérfluos).

Capa de ‘Given’ volume 1, impresso com miolo em offset (Alta Alvura) | Divulgação/NewPOP.

Nos últimos anos, o livro — e o mangá, por extensão — vêm acompanhando esses solavancos provocados por uma gestão vertical da crise. Nesta semana, a Suzano Papel e Celulose anunciou um novo reajuste no preço de seus produtos. Segundo nota repassada à empresas que compram o seu material, haverá, em janeiro de 2021, um aumento de 15,5% no preço dos papéis Paperfect (offset 70g), Pólen (soft e bold, 70g-90g), Alta Alvura (offset 120g) e Reciclato (100% reciclado, 56g). Os três primeiros costumam ser utilizados nos mangás que temos por aqui.

A notícia preocupa leitores e também os responsáveis pelo mercado brasileiro de mangás. No último mês, a Panini reajustou uma série de títulos de seu catálogo, passando boa parte deles a custar R$ 29,90. A JBC não fez diferente e lançou este mês a reimpressão de Hunter x Hunter em papel offset pelos mesmos R$ 29,90.

Para dar um panorama, as principais editoras de mangá do Brasil trabalham com o papel proveniente da Suzano. A empresa brasileira fornece para JBC, NewPOP, Panini, Pipoca & Nanquim e Devir.

Volumes 1 e 2 da nova reimpressão de ‘Hunter x Hunter’ | Divulgação/JBC.

JBox conversou com a equipe de produção da JBC para entender os impactos da medida. É certo que haverá reajuste nos preços em breve:

Todos os anos existe um dissídio de fornecedores de serviços e de matéria-prima. O que ocorreu de diferente esse ano, com a Suzano principalmente, foi o montante ajustado. Certamente acarretará em revisão de preços em praticamente toda a linha que utiliza os insumos deste fornecedor, que são os produtos em Pólen e offset (Alta alvura).

Capa nacional do 1º volume de ‘Sunny’, impresso com miolo em Pólen Bold 90g | Divulgação/Devir.

Uma realidade no nosso mercado é a utilização de material importado para driblar os preços altos em momento de baixa oferta no mercado interno. Isso porque a exportação do papel brasileiro para parceiros comerciais, como a China, feita de maneira desenfreada pode acarretar no desabastecimento dos estoques nacionais, fazendo com que as editoras tenham que optar por uma via externa. A Panini, por exemplo, chega a importar papel da própria China (por vezes o papel brasileiro!), quando não encontra o material em condições favoráveis no Brasil. A Devir imprimiu alguns de seus títulos na Europa, como é o caso de Tekkon Kinkreet, Uzumaki e outros do selo Tsuru, que utilizam miolo em papel munken  – de aspecto e gramatura semelhante ao pólen 90g.

O dólar alto, no entanto, tem barrado esta operação, além de toda a complexidade logística envolvida. A editora de Cavaleiros do Zodíaco no Brasil complementa:

Os papéis importados, por conta da variação cambial, correm mais risco de escassez. As importadoras começam a não ter sustentabilidade na operação e paralisaram o fornecimento. É o caso do Lux Cream, papel que utilizamos em Akira, por exemplo. Essa situação nos obriga a migrar para o fornecedor nacional. E o problema é que o mercado aqui é extremamente concentrado, nos deixando de mãos atadas e sujeitos a essa variação de preços. Além da questão da falta de variedade de papéis, o que limita bastante nosso estudo de produto.

O leitor brasileiro, seja ele de mangás ou de qualquer outro segmento, terá dificuldades de acordar dos sonhos intranquilos que têm acometido todos os que recorrem à leitura para melhor enxergar a vida e passaram, mais recentemente, a esbarrar em preços elevadíssimos. Como se as questões mencionadas acima não bastassem, uma reforma tributária proposta pelo Governo Federal (a PL 3.887/2020) está prestes a ser votada em plenário da Câmara – junto a uma outra proposta apresentada pelo legislativos (PEC 45) – e pretende taxar o livro em 12%. Cabe ressaltar que o mercado do livro é, hoje, protegido da cobrança de impostos pelo artigo 150 da Constituição Federal, além de ter isenção de Cofins e Pis/PASESP desde a lei 10.865, de 2004. Veremos se assim permanecerá.