Um dos tipos de animê/mangá mais populares pelo mundo é o shonen e anualmente dezenas de histórias e séries são lançadas para conquistar um público globalizado. Ansiosos por histórias criativas e surpreendentes, mas que não se afastem muito das características comuns dessa demografia, alguns títulos conseguem conquistar fama e sucesso com o público sem necessariamente ser disruptivos – como Ranking of Kings.

É quase como um reality culinário: os mesmos ingredientes podem render versões tão diferentes de um profissional para o outro, que o que conta ao final é a apresentação e o sabor – por mais que em algum momento, um ou outro elemento possa remeter a uma outra experiência.

E Jujutsu Kaisen é exatamente isso: uma entrega honestamente recheada de referências a outras histórias do gênero shonen (Yu Yu Hakusho e Bleach soam mais alto), mas com um elenco tão carismático e um enredo (ainda) tão cheio de mistérios que você só quer consumir mais. E que bela apresentação o estúdio MAPPA realizou na adaptação televisiva do mangá de Gege Akutami. Visual, efeitos e, principalmente, a trilha sonora fizeram deste o anime favorito do público, em diversos cantos do mundo, no ano de 2021.

Imagem: Yuta em cadeira, triste.

Uma cena familiar, não acha? | Reprodução: MAPPA.

Uma coisa que particularmente me chama atenção em Jujutsu Kaisen e me leva a acompanhá-lo (em mangá e animê) é como sua narrativa despeja personagens e eventos sem dar muita informação a respeito destes. Em algum momento você obtém um fragmento de informação mas tudo ainda parece pouco pro monte de perguntas que ficam no ar.

Some isso à dinâmica das animações contemporâneas (esqueça o tempo de cinco ou mais episódios para explicar a motivação de um personagem!) que você pode se flagrar sem entender muita coisa em algum momento. Mas ainda assim, aceita que Jujutsu é bacana e vale a pena acompanhar.

Nesse cenário, o mangá Jujutsu Kaisen 0 – que apresenta uma história com eventos anteriores à história de Yuji Itadori e o Sukuna – se torna um item de consumo obrigatório para qualquer fã entender mais sobre o universo da série e sua transposição sob formato de filme para cinema foi um acerto do time de produção do Mappa que resultou em uma das maiores bilheterias da história do Japão – a 15ª maior da história, até o lançamento do filme no Brasil.

Numa adaptação quase que literal do que é visto no papel, o trabalho do estúdio em encher os olhos dos fãs consegue ir para um patamar ainda maior do que foi apresentado na série de TV – cortesia de mais orçamento, evidentemente.

Enquanto uns estúdios gastam tubos de dinheiro em um CGI duro pra uma de suas vacas sagradas, o Mappa entrega uma direção artística vigorosa com cenários, cores e fotografia dignos de um filme para cinema. As cenas de luta, ponto alto de qualquer animê shonen, são absurdas de bem coreografadas – acho que a ideia era tentar causar uma imersão como se a luta final fosse entre dois personagens em carne e osso, em virtude dos ângulos da câmera.

Imagem: Rika prometendo coisa com Yuta quando crianças.

Uma promessa, ou uma maldição? | Reprodução: MAPPA.

Amor, a pior das maldições?

Na trama, conhecemos Yuta Okotsu, um estudante que sofre o trauma de perder sua melhor amiga de infância, Rika. Ela se torna uma maldição que passa a acompanhar o garoto e quando este é vítima de bullying no colégio, a fúria incontrolável de Rika gera episódios que chamam atenção da escola de Jujutsu de Tóquio.

Tal como “adota” Itadori na série de TV, Satoru Gojo, faz o mesmo com o perdido e triste Yuta e partir daqui vamos assistindo a transformação e crescimento do personagem. É interessante pontuar como Yuta é o avesso de Itadori mas igualmente carismático.

Observando tudo nas sombras está a figura de Suguru Geto. Quem acompanhou a série de TV descobrirá mais pistas em torno do passado do moço, sua relação com a escola Jujutusu e seu relacionamento com Gojo – responsável por várias cenas cômicas inspiradas, para aliviar o clima pesado da vida de Okotsu.

Na medida que Yuta Okotsu vai aprendendo a administrar seus incríveis poderes, ao lado de rostinhos conhecidos e mais joviais de alguns personagens bacanas da série de TV, Suguru Geto arma um plano que visa tomar Rika para si. Atraindo a atenção de todos os feiticeiros “do bem” para um evento sinistro envolvendo youkais em pleno natal, Geto consegue driblar (de forma um tanto fácil demais no meu ponto de vista) seus oponentes mais poderosos para conquistar sua ambição.

Imagem: A turma de Yuta na escola Jujutsu.

Esses três dão um show! | Reprodução: MAPPA.

Com isso, temos a sequência final do filme com lutas de tirar o fôlego entre os estudantes de Satoru Gojo e o poderoso feiticeiro. O amadurecimento de Yuta é o ponto chave para o desfecho do filme e ao final temos uma lição (sem tanta filosofia como uns outros animês fariam questão de explorar para dar um ar mais “cabeça”) sobre “deixar pra trás e seguir em frente”.

O ponto mais agradável do filme e que faz os fãs saírem satisfeitos das salas de cinema é o jeito como a narrativa é extremamente fácil de ser compreendida – capaz de conquistar até aquele seu amigo que não viu um episódio da série. O final aberto é um extra que poderá arrastar mais uma vez uma multidão aos cinemas para ver uma continuação deste arco bastante agregador ao que a história tem para contar.

A convite da Sony/Crunchyroll, o JBox assistiu previamente a versão dublada do longa e a experiência dessa forma é edificante. Pedro Alcântara (o Coby de One Piece e o Nate em Yokai Watch) dubla o protagonista do longa, Yuta Okotsu, com o tom ideal para um personagem tão “pesado” que é forçado a ser mais “leve” ao fazer parte da sua “turma do colégio Juju”.

Léo Rabelo rouba a cena com seu Satoru Gojo, cada vez mais afinado e a tradução se deu alguma liberdade criativa no texto para inserir umas piadinhas no melhor estilo da versão brasileira Yu Yu Hakusho.

Mesmo não passando de um episódio esticado, o fato de ser cânon e ter um roteiro interessante faz Jujutsu Kaisen 0 um entretenimento divertido para os fãs ansiosos pela segunda temporada da TV e ainda consegue ser agradável aos “recém-chegados” na história dos feiticeiros e suas maldições.

Mereceu todos os bilhões de ienes das bilheterias japonesas? Pela qualidade técnica sim, mas se a história do mangá fosse incorporada como um arco extra na série de TV, dava pra se consumir muito bem – e talvez até com mais tempo de tela para o mundaréu de personagens que aparecem no ato final do filme.


Esta resenha foi feita a partir de screener de Jujutsu Kaisen 0 enviado previamente ao JBox pela assessoria da Crunchyroll. A convite da Sony, o JBox também compareceu a uma cabine de imprensa do filme, com exibição dublada. A estreia ocorre no dia 28 de abril nos cinemas brasileiros.


O texto presente nesta resenha é de responsabilidade de seu autor e não reflete necessariamente a opinião do site JBox.