há algum tempo, há um certa suspeita entra a relalção da empresa japonesa Good Smile Company — conhecida por fabricar diversas figures, entre elas, o Nendoroid — e o site 4chan, que há quase uma década é apontado como um ninho da extrema-direita, sendo acusado como direta ou indiretamente responsável por diversas tragédias, como tiroteios em escolas e fornecer um espaço no qual teorias de conspiração — algumas relacionadas ao ataque ao Capitólio nos EUA — nascem e circulam livremente.

O veículo jornalístico WIRED soltou no dia 29 de março uma reportagem alegando que, mesmo com boicotes e fuga de anunciantes, o 4chan seguiu em pé ao longo desses anos em parte devido a um investimento de 2,4 milhões de dólares da Good Smile Company (GSC) — os documentos obtidos pelos jornalistas mostrariam não apenas como Hiroyuki Nishimura, atual dono do site (e criador do 2chan), comprou o 4chan mas também o envolvimento entre o espaço virtual e algumas empresas japonesas.

imagem: printscreen (antiga) do 4chan.

Reprodução.

Segundo os dados divulgados, Nishimura investiu 800 mil dólares do próprio bolso, e 4,8 milhões de dólares por meio de sua empresa, com dinheiro obtido de uma empresa japonesa de telecomunicações. Além de Nishimura, a GSC comprou 30% das ações do 4chan, com um investimento total de 2,4 milhões de dólares, em 2015.

O WIRED conseguiu os documentos por meio da promotoria de Nova Iorque, que investigou o site em maio de 2022, após uma chacina em Buffalo, Nova Iorque. Apesar de diversas alegações e provas pontuais aqui e ali, os materiais confirmam pela primeira vez a relação empresarial entre a GSC e o 4chan — relação essa que anda comprometida, conforme a indignação cresce; a GSC estaria em vias de encerrar essa parceria, logo agora que um contrato de anos com a Walt Disney Company chegaria ao fim.

A investigação começou a pedido da governadora Kathy Hochul, numa tentativa de saber se o 4chan poderia enfrentar processos civis ou penais por promover, facilitar ou prover uma plataforma para planejar e promover violência — a cidade de Nova Iorque não seguiu com acusações criminais contra o site ou seus donos, mas ainda há investigações em curso por meio de outro agentes.

A GSC esconde há anos sua relação com o 4chan — quando informações começaram a surgir mostrando relação entre a empresa e o site, a especulação era que o interesse no 4chan seria pelo espaço servir de termômetro para a empresa poder decidir em quais produtos/marcas investir. Nesses anos, a GSC expandiu a produção de figures, indo de mangás famosos até séries e filmes americanos, como Matrix. Mas o grosso do dinheiro vinha das figures e bonecos feitos em parceria com a Disney.

imagem: olaf e elsa em versão nendoroid.

Divulgação: GSC/TWDC.

Foi em 2021 que começaram a surgir alegações de envolvimento com a plataforma, quando ex-funcionários da filial em Los Angeles (EUA) abriram um processo contra a GSC e, nele, alegavam que a empresa era responsável por distribuir produtos e mercadorias com potencial sexual explícito (“lolicon”) e financiava o 4chan às encondidas de seus parceiros comerciais — após veículos jornalísticos cobrirem o caso, a empresa assumiu possuir investimentos “passivos” no 4chan. O processo foi encerrado sem que as alegações fossem provadas.

No ano passado, o WIRED obteve documentos detalhando um acordo de confidencialidade (NDA) entre Nishimra, a GSC e Dwango, uma empresa de telecomunicações de Tóquio — nesse documento, é mostrado que as três conversavam para adquirir o 4chan. Em dezembro de 2022, veio uma reportagem do New York Times confirmando que Nishimura comprou o site com recursos de mais 3 parceiros japoneses (cujos nomes não foram revelados).

Em entrevistas, Nishimura confirmou a relação com a GSC — particularmente com o presidente da empresa, Takanori Aki –, mas disse que a empresa estaria deixando a parceria.

Com o surgimento de informações ligando a GSC ao 4chan, os parceiros comerciais ficaram com pé atrás. Por exemplo, apesar de não comentar oficialmente, fontes dentro da Disney confirmam que a empresa não deve renovar seu contrato com a GSC, que expira em maio, após tomar conhecimento do caso.

imagem: foto de hiroyuki nishimura.

Nishimura em foto. | Divulgação.

Mas e o outro parceiro comercial de Nishimura? Segundo o WIRED, nos anos 2000, Nishimura fez uma parceria com Nobuo Kawakami, o jovem presidente da Dwango. Os dois estariam envolvidos na criação do NicoNico, uma espécie de YouTube do Japão.

E, assim como o 2chan, o NicoNico logo se tornou um espaço onde comentários racistas, sexistas (e mais…) circulavam em massa e anonimato — e os sites levavam tráfego um para o outro. Esse espaço, diga-se de passagem, foi muito bem aproveitado pelo Jiminto/LDP, partido de direita (com pés nas extrema-direita) que governa o país quase ininterruptamente há mais de 60 anos.

Os dois amigos e parceiros comerciais começaram a pensar em como entrar no mercado americano, mas os planos foram atrapalhados quando Nishimura foi alvo da polícia de Tóqui em 2012, por envolvimento em tráfico/comercialização de drogas por meio do 2chan. Apesar de Nishimura não ter sido formalmente acusado, a possibilidade de Nishimura ser preso fez Kawakami retirá-lo dos negócios da Dwango, embora seguissem como amigos.

Em 2014, a Dwango comprou as ações de Nishimura no NicoNico. Em 2015, Christopher Poole, criador do 4chan, anunciou que deixaria a plataforma — e aí, Nishimura entra para comprar o site, com negociações envolvendo também a GSC e a Dwango.

Para Kawakami, seria uma forma de entrar no mercado americano e em outros mercados mundiais. Mas, no fim das contas, o CEO do Dwango teve medo dos riscos legais e não entrou oficialmente no negócio — embora acredite-se que parte do dinheiro de Nishimura veio da empresa dele.

Nishimura nega conexões entre a plataforma e ataques reais — segundo ele, o 4chan promove ideologias de supremacia branca da mesma forma que a retórica do ex-presidente Donald Trump. Contudo, há movimentos, dentro e fora dos EUA, para responsabilizar plataformas online por distribuir esses conteúdos, ao menos da forma como ocorre no 4chan.


Fonte: WIRED