Estamos a poucas horas da 94ª edição do Oscar. A maior premiação do cinema não conta com animês entre seus indicados este ano, porém isto não impediu que um outro filme japonês fizesse história na cerimônia.

Drive My Car não só foi indicado a Melhor Filme Internacional (categoria na qual é o grande favorito), como também conseguiu indicações pra Melhor Roteiro Adaptado, Direção e Filme. O longa do diretor Ryusuke Hamaguchi conseguiu tal feito ao mostrar uma obra intimista e que pode falar com qualquer espectador, principalmente por se tratar de um tema tão universal quanto o luto.

Imagem: Misaki sendo apresentada para Kafuku.

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A trama gira em torno de Kafuku, um diretor de teatro que, após dois anos, continua enlutado por sua esposa. Ele então parte para Hiroshima, para produzir uma nova versão da peça Tio Vânia, de Anton Tchekhov (1860-1904). Lá, ele descobre que a produção designou uma motorista para ele, Misaki, uma jovem calada que passa a lhe fazer companhia.

Durante a produção da peça, Kafuku se vê obrigado a encarar seu passado, seu presente e também seu futuro quando segredos de sua falecida esposa vêm à tona.

Imagem: Kafuku com caneta na mão, pensando.

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O filme adapta o conto homônimo de Haruki Murakami, publicado na coletânea Homens sem Mulheres. Porém, não é a única história adaptada no filme, que conta com elementos de outras histórias do autor, além de inserção de Tio Vânia durante toda a rodagem. E aqui vemos o primeiro grande feito de Ryusuke Hamaguchi: adaptar um conto em um filme de 3 horas de duração.

Claro, isto infelizmente pode afastar uma parcela do público, mas fato é que o diretor se valeu do tempo não apenas para expandir pontos pouco explorados no conto, mas também para criar uma atmosfera mais intimista. O tempo também é usado para mostrar longas passagens dentro do carro, ora silenciosas e contemplativas, ora com Kafuku ensaiando as falas da peça.

Quando o vemos ensaiar no carro, o diretor consegue inserir falas dentro do contexto não só das cenas mostradas antes ou depois, mas também do íntimo do personagem, que consegue por alguns momentos externar seus sentimentos. Já os momentos de quietude reforçam um personagem ainda guardando dentro de si tantos sentimentos que ainda não é capaz de pôr para fora.

Imagem: Misaki dirigindo o carro, com Kafuku no banco de passageiro.

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As atuações são um espetáculo à parte. Enquanto os atores principais transmitem uma aura soturna, os coadjuvantes ganham mais espaço de expressão. Um contraste que evidencia ainda mais a solitude dos protagonistas – em especial Kafuku. O uso de diversas línguas diferentes no longa – que vão desde o japonês até a língua coreana de sinais – enfatiza que a comunicação não tem barreiras. O diretor mostra ao público que, independente da forma como nos comunicamos, sempre podemos achar alguém capaz de nos entender e nos ouvir.

Imagem: Kafuku no banco de passageiro (mas do lado "errado").

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As cenas de carro podem parecer cansativas no começo, mas com o tempo notamos serem necessárias. O carro é um terceiro protagonista, que conduz seus parceiros de cenas por tomadas belas e bem executadas. E mesmo que muitas cenas sejam longas, elas são apenas um reflexo de como a jornada para a superação e aceitação muitas das vezes podem demorar.

Drive My Car não agradará a todos. Sua temática não é inovadora (o próprio Oscar já premiou dois filmes sobre pessoas que tiveram sua vida mudada com a ajuda de seu motorista). Mas a dedicação e delicadeza de Hamaguchi em entregar uma obra contemplativa e, como dito anteriormente, intimista, mostra que seu sucesso e reconhecimento não são por acaso.


A convite da MUBI, o JBox participou de uma exibição especial do filme. O longa está em cartaz nos cinemas e, em breve, estreia exclusivamente na plataforma de streaming.


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