Nos últimos anos, papo de mais de uma década já, os animês no subgênero isekai se tornaram uma constante cada vez maior dentro do cardápio de estreias em temporadas. Isekai (異世界) é uma palavra traduzível como “outro mundo”, e indica, dentro desses animês, que os personagens, geralmente protagonistas, vão parar em outro mundo por determinada razão. E essa razão pode ser por outra palavra que também vem sendo utilizada para descrever essa onda: tensei.

Tensei (転生) é um termo vindo do budismo que significa “reencarnar”, “renascer”, “transmigrar”, mas tudo isso num sentido de ver sua alma, memórias, essência de vida, partir de um corpo para outro após a morte. Não à toa, muitos desses animês isekai/tensei partem da premissa de que os protagonistas, perante acontecimentos fatais, morrem e renascem em outro mundo, mas com suas memórias passadas ainda na cabeça.

Ocorre que, da década passada para cá, com o sucesso de Sword Art Online (2012), Re:Zero (2016), e seus derivados, recebemos anualmente uma enxurrada de animês nessa pegada. Ótimos, bons, razoáveis, tenebrosos, a qualidade varia. Mas há um ponto que quase todos esses têm em comum: eles pouco conseguem inovar dentro do subgênero.

Com variações de enredo, cenário e tom, quase sempre o que temos são histórias de pessoas que renasceram, ou foram transportadas, de um mundo para outro. E aí, vivem aventuras nesse novo lugar apoiados nos conhecimentos que já têm da vida anterior. Nessa, Solo Leveling acaba sendo uma grata surpresa, pois pega as bases desse gênero e inverte prum jeito diferente de execução.

Baseado em uma web novel sul-coreana de 2016 feita por Chugong, que ganhou também uma adaptação em manhwa digital (ou seja, uma webtoon) ilustrado por Jang Sung-Rak, Solo Leveling se passa numa realidade onde o mundo está sendo invadido por monstros vindos de portais.

Tais portais dão acesso a dungeons, como em jogos de videogame ou RPGs, onde alguns humanos que passaram por um tipo de renascimento em vida, intitulados como caçadores, podem entrar, enfrentar os desafios, e pilhar os tesouros. Mas há uma regra: nos renascimentos, são arbitrariamente estipulados níveis para os caçadores, e eles não podem ficar mais fortes, independente do que façam dali em diante.

Nessa, acompanhamos o caçador Sung Jinwoo. Mas ele não é qualquer caçador. Jinwoo é conhecido no meio como o… caçador mais fraco de todo o mundo! Ele renasceu com um nível baixíssimo, não consegue render nada nas dungeons, e quase sempre fica à beira da morte. Mas as coisas mudam para Jinwoo quando ele, junto de uma party, participa de uma dungeon dupla sem precedentes, na qual quase todo seu grupo é morto por uma criatura de poderes e imponência divina.

Calha de Jinwoo tomar algumas decisões nesse desafio que fazem com que ele seja o único dos sobreviventes a ser deixado para trás. E nessa, ele é acoplado por algo chamado “Sistema”, que o dá um segundo renascimento. Agora, Jinwoo, diferente de todos os outros caçadores até então, tem a habilidade de subir de nível através de treinamento e da derrota de inimigos.

Daí em diante, a história segue as aventuras de Jinwoo passando de desafio em desafio para adquirir nível, utilizando as recompensas adquiridas para se tornar mais poderoso, com essa escalada de poder se refletindo também em sua aparência física e personalidade. O moleque que, antes, era franzino, tímido, e parecia ter medo de tudo ao redor, agora é musculoso, confiante e traz um fogo intimidador no olhar.

imagem: jinwoo estendendo a mão para pessoa de armadura vermelha caída no chão, sentada.

Imagem: Crunchyroll

Solo Leveling então se mostra como uma opção diferente de isekai/tensei. Em vez de o protagonista reencarnar em outro mundo, seu renascimento e mudança ocorrem em sua própria realidade. E essa realidade nem é exatamente a mesma de antes. O twist está também em não ser o personagem a ir para outro mundo, sim esse outro mundo vir ao dele. E aí, são utilizadas as mesmas mecânicas gamers presentes em outras séries, mas com elas funcionando apenas para ele.

E o enredo coloca ainda alguns temas interessantes para discussão. Um deles, 100% fantasioso em nosso mundo, mas que funciona nessa história de fantasia, é o da meritocracia. Numa realidade onde o destino de todos parece já determinado no nascimento (no caso, num renascimento), é interessante acompanhar um ponto fora da curva na figura do Jinwoo com o apoio do Sistema. Ele é a exceção, aquele que consegue, pelo esforço, atingir um novo patamar. Seu arco de aprendizagem e evolução nos serve como uma parábola para os pensamentos meritocráticos.

É possível desenvolver interpretações diferentes a partir disso. A minha é a de que isso só expõe o quanto a meritocracia é uma corrente demasiadamente frágil. Jinwoo é o único desse mundo que, de fato, consegue evoluir. E isso só acontece por ele ser apoiado pelo Sistema, algo com um grande poder e influência que o pega como apadrinhado, o oferecendo mais possibilidades do que ele teria em sua vida normal. Sem isso, ele jamais conseguiria se equiparar aos que renasceram com o privilégio de um nível alto. A alegoria é tão sutil quanto um rinoceronte, mas faz sentido.

O problema é que, se nos conceitos básicos do subgênero Solo Leveling consegue se destacar ao fazer diferente, em questão de narrativa as coisas são muito dentro da caixinha. A subversão é legal, as críticas que ele traz são bacanas, mas o modo como a história é contada não foge ao comum de outros animês do tipo.

imagem: jinwoo vendo o sistema.

Imagem: Crunchyroll

Os episódios focados em descoberta de habilidades, treinamento e desafios não surpreendem caso você tenha assistido a outros animês isekais de temporadas passadas. E o andamento deles acaba sendo quase lento demais em comparação com o de outros.

Com exceção da personagem Lee Joo-hee, uma caçadora de nível alto com a habilidade de cura, mas que prefere pegar missões de baixo perigo, e desiste dessa vida após eventos traumáticos, nenhum outro coadjuvante tem desenvolvimento ao longo da trama. No fundo, tudo parece uma desculpa para que sejam mostradas lutas bonitas e algumas cenas chocantes, mas que perdem um pouco do brilho, já que quase nada mais é elaborado no espaço entre elas.

Mas há pelo menos um segmento muito legal, a já mencionada dungeon dupla onde a party do Jinwoo é quase toda assassinada. O momento em que eles enfrentam a ameaça, com uma presença meio abissal, divina, como se fosse algo de escala imensurável, lembra os ótimos momentos de Gantz, por exemplo. Uma pena que esse é o ponto mais alto da temporada, com nada se equiparando em qualidade nos vários episódios seguintes.

Solo Leveling é mais interessante do que bom. O modo como usam os conceitos de isekais/tenseis surpreende, a crítica à meritocracia é esperta, mas em questão de aproveitarmos uma boa história sendo contada, aí é bem difícil.


O Rio Grande do Sul está em situação de calamidade pública, passando por uma das piores tragédias da história do estado, após fortes chuvas e enchentes que permanecem em algumas regiões. O governo estadual reativou o PIX do “SOS Rio Grande do Sul”, criado ano passado, quando o estado foi também assolado por fortes chuvas, para receber doações que serão direcionadas para dar apoio humanitário às vítimas. Para ajudar, doe pela chave CNPJ 92.958.800/0001-38.

O governador do estado, Eduardo Leite, recentemente informou que o dinheiro doado será utilizado com foco na reconstrução da vida das pessoas afetadas pelas chuvas e enchentes, e não em assistência premente. Caso prefira doar para uma instituição da linha de frente nos resgaste e auxílios imediatos, a Vakinha está realizando o Movimento SOS Enchentes. Outros movimentos confiáveis também estão recebendo doações, como o Cozinhas Solidárias, do MTST, que está oferecendo comida para desabrigados e necessitados. Os Correios estão recebendo doações de insumos (roupas, itens básicos, alimentos etc) para envio sem custo às vítimas. Se preferir, doe para outra instituição de sua confiança.


Solo Leveling é exibido pela Crunchyroll, com opções dublada e legendada. O serviço fornece um acesso de imprensa ao JBox.


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