Chegamos a mais uma edição da Sakuga no Hanashi — estamos aqui novamente para falar sobre animação! E após mais de dois anos de espera, o tão aguardado longa-metragem de Black Clover finalmente está entre nós: o filme Black Clover: A Espada do Rei Mago (Black Clover: Mahou Tei no Ken) estreou exclusivamente nos cinemas japoneses, e mundialmente pela plataforma de streaming Netflix no dia 16 de junho.

imagem: pêster de de black clover: a espada do rei mago.

Divulgação: PIERROT/NETFLIX.

E como o grande fã de Black Clover que eu sou, eu não poderia deixar passar a oportunidade de comentar a respeito da produção do filme! Quem esteve envolvido nessa produção? Quais mudanças tivemos na equipe do longa em comparação ao animê? Quais os principais destaques? Será que essa equipe conseguiu superar os seus limites e as expectativas dos fãs, ultrapassando as adversidades que restringiam a produção do animê para TV? Vamos descobrir!

ÍNDICE:

  1. A produção conturbada do animê de Black Clover;
  2. A equipe de Black Clover: A Espada do Rei Mago;
  3. Animação do longa;
  4. Direção e storyboard;
  5. Cenários e composição;
  6. O impacto mundial d’A Espada do Rei Mago;
  7. Considerações finais.

 

A produção conturbada do animê

Antes que possamos falar sobre o filme de Black Clover, é preciso comentar a respeito do animê, entender as múltiplas condições adversas que sofreu durante seus anos em produção, conhecer a história de dedicação e perseverança de sua equipe, para então podermos de fato falar sobre o longa, e como ele conseguiu ultrapassar as expectativas dos fãs. Então vamos fazer apenas uma breve retrospectiva da produção do animê original, dado que esse é um assunto que pretendo explorar em mais detalhes futuramente.

A adaptação do mangá de Yuki Tabata (田畠 裕基) foi ofertada à TV Tokyo e ao estúdio Pierrot — famoso por produzir outras séries de longa duração baseadas em obras da Shonen Jump, como Naruto, Naruto Shippuden e Bleach. Essa oferta tinha como intuito produzir uma série que seria inicialmente composta de 51 episódios, transmitidos continuamente pela emissora ao longo de um ano. Porém, havia um problema: o curtíssimo prazo que o estúdio teria para produzir o animê.

De qualquer forma, o estúdio aceitou, apesar do cronograma apertadíssimo que eles aceitaram para entregar a série. A única equipe de produção disponível era a equipe da produtora Maiko Isogai (礒谷 麻依子), que tinha acabada de produzir o anime de Twin Star Exorcists (Sousei no Onmyouji), obra que já vinha sofrendo com cronogramas apertados e falta de recursos. Agora, essa mesma equipe teria que emendar a produção Black Clover, com um ínfimo tempo disponível para pré-produção e consequentemente, a produção de animação.

Tatsuya Yoshihara (吉原 達矢) se juntou ao projeto, assumindo o papel de direção. Yoshihara era um animador e diretor em rápida ascensão — um membro da vanguarda de um movimento de animadores digitais, a chamada web-gen — que aspirava dirigir um animê shounen de ação, e acima de tudo, um diretor cheio de contatos os quais o estúdio poderia explorar.

E assim , ao invés de investir os recursos que seriam necessários para produzir um animê de ação assim tão longo e exigente sob um cronograma tão apertado, o estúdio deixou que Yoshihara se virasse por conta própria, dependendo apenas de seus contatos para carregar a produção adiante. No fim, a dedicação e a perseverança de Yoshihara e sua equipe, em meio a todo tipo de adversidade, acabariam se tornando a principal força dessa produção.

Mas enquanto que seus contatos e ambições de fato renderam ótimos episódios iniciais, graças ao apoio de jovens animadores da web-gen, como Isuta Meister, Yusuke Kawakami e Shota Goshozono, os problemas que assolavam o projeto continuava a se acumular, ameaçando esmagar as ambições de Yoshihara e sua equipe, que tinham cada vez mais dificuldade para encontrar recursos.

imagem: concept art do asta.

Design sheet do personagem Asta, por Itsuko Takeda (竹田逸子).

Durante o primeiro ano da produção, Yoshihara muitas vezes se queixava no Twitter, falando sobre a dificuldade em achar animadores, diretores e artistas de storyboard dispostos a trabalhar na série. Sobrecarregado, sem recursos, sem tempo e nem mesmo apoio do próprio estúdio, Yoshihara se via na necessidade de dirigir episódios, produzir storyboards, animar, corrigir e até mesmo recrutar animadores por conta própria.

Apesar de tantas dificuldades esmagadoras, Black Clover seguiu em frente e a ambição e dedicação da sua equipe se mantiveram firmes e fortes ao longo dos anos, entregando alguns episódios incríveis! Isso foi graças à disponibilidade do estúdio Mouse (マウス) como principal estúdio de terceirização do animê — servindo como um alicerce vital para o projeto — e rápida popularização da prática de recrutar animadores estrangeiros para trabalhar dentro da indústria de animação japonesa, justamente com o intuito de combater a crescente falta de animadores na indústria. Animadores inexperientes, porém definitivamente promissores, que acima de tudo, estavam dispostos a trabalhar até mesmo nas produções mais conturbadas. De fato, muitos jovens animadores ao redor do mundo tiveram a sua oportunidade de ingressar nessa indústria graças a Black Clover.

A equipe poderia simplesmente ter desistido diante das circunstâncias que se acumulavam contra eles, porém, nunca desistiram do projeto e suas ambições de criar algo incrível e memorável, principalmente diante do apoio e carinho incondicional dos fãs da animê ao redor do mundo. E eles com certeza criaram algo incrível e memorável: de acordo com a plataforma de streaming Crunchyroll, que possuía os direitos de distribuição da série mundialmente, Black Clover foi um dos animês mais assistidos do serviço em 83 países!

 

A equipe de Black Clover: A Espada do Rei Mago

Quanto à equipe de produção responsável pelo filme, ela se manteve praticamente a mesma desde o fim do animê há dois anos atrás, com exceção algumas adições mais específicas para o longa. Caso vocês não conheçam a equipe por trás do anime de Black Clover, vou comentar brevemente a respeito de alguns dos seus principais membros.

imagem: parte da equipe do filme em vídeo de bastidores da netflix.

Reprodução: NETFLIX.

Começando pelo ex-diretor assistente Ayataka Tanemura (種村綾隆), que havia sido promovido ao cargo de diretor da série durante os seus últimos meses de exibição. Ele foi responsável pela direção de A Espada do Rei Mago.

Nenhum dos dois roteiristas principais do animê retornaram para escrever o roteiro do filme, o papel foi confiado a dupla Johnny Onda (ジョニー音田) e Ai Orii (折井愛).

Esses dois são não têm experiência quando se trata de trabalhar em animações, mas Onda pelo menos não é nenhum estranho quando o assunto se trata de Black Clover, dado que ele é o escritor responsável pelas três light novels derivadas do mangá original por Yuki Tabata, que aliás, foi responsável por supervisionar a produção do filme e criou os designs para os personagens originais do longa — Conrad Leto, Jester Galandros, Edward Avalaché, Princia Funnybunny e Millie Maxwell.

Já em relação à Ai Orii, não se sabe muito ao seu respeito; provavelmente alguém relacionada à Onda ou ao próprio Tabata, auxiliando na escrita do roteiro.

imagem: um livro que parece ser algum media guide ou databook do filme.

Divulgação.

Isuta Meister (椅子汰), que começou na produção da série como um de seus principais animadores de ação em episódios in-house, atuou como diretor de animação de ação em episódios terceirizados (corrigindo ou até mesmo refazendo sequências de ação a mando do diretor de unidade ou diretor geral). Isuta fez sua estreia como diretor de unidade e artista de storyboard no episódio 118, ficando responsável por dirigir e criar o storyboard para a primeira metade do episódio — Parte A. Posteriormente, ele foi responsável pela direção e storyboard da 11ª abertura do anime e dos episódios 151 e 167 (só storyboard da Parte A).

Em Black Clover: Mahou Tei no Ken, Isuta foi um dos três responsáveis pelo storyboard do filme, ao lado do diretor, Ayataka Tanemura e do ex-diretor-chefe, Tatsuya Yoshihara.

imagem: foto de documento do storyboard do filme.

Storyboard de Black Clover: A Espada do Rei Mago (Parte F), por Ayataka Tanemura (種村綾隆), Isuta Meister (椅子汰) e Tatsuya Yoshihara (吉原 達矢)

Itsuko Takeda (竹田逸子) continua atuando como a principal designer de personagens da franquia. No passado, muitos fãs criticaram os designs dela, que devido ao seu próprio estilo, se sobrepôs ao traço original do Yuki Tabata, além de apresentar uma complicação mais técnica, sendo desenhos bem mais detalhados do que os do próprio Tabata, tornando esses designs desnecessariamente complexos de se animar, algo que fica ainda mais agravante em um animê com uma produção tão corrida e conturbada como Black Clover.

imagem: design sheet de conrad.

Design sheet do personagem Conrad Leto, por Itsuko Takeda (竹田逸子).

Pode-se dizer que Takeda aproveitou bem o tempo que teve durante a produção do filme, atualizando os designs de todos os personagens principais, deixando mais próximos da arte atual do mangá original — assim também os tornando mais práticos para animação. Um esforço que certamente poupará tempo, se (quando) o animê de TV retornar.

Como designer de personagens, Takeda também atuaria como diretora-chefe de animação do filme, realizando correções na arte das animações-chave primária e secundária do filme. Junto dela, atuando como diretores-chefe de animação, também temos a sub-designer de personagens do animê, Kumiko Tokunaga (徳永久美子), e também, o designer de propriedades (prop designer) Kosei Takahashi (高橋恒星).

imagem: concept art de princia.

Design sheet da personagem Princia Funnybunny, por Itsuko Takeda (竹田逸子)

O filme conta com o retorno de Aiko Shinohara (篠原愛子) como designer de cores, responsável por definir a paleta utilizada no projeto, tanto para personagens quanto para objetos, decidindo o tom exato que deverá ser usado em cada elemento em diferentes cenas.

imagem: guia com arte conceitual de jester e as cores usadas.

Color sheet do personagem Jester Galandros, por Aiko Shinohara (篠原愛子).

 

imagem: guia com arte conceitual de jester e as cores usadas (segunda parte).

Color sheet do personagem Jester Galandros, por Aiko Shinohara (篠原愛子).

 

Yuki Maeda (前田有紀) retorna como a diretora de arte, sendo ela a responsável desenvolver os designs dos cenários que serão usados ao longo do projeto.

imagem: arte conceitual de coliseu do filme.

Designs por Yuki Maeda (前田有紀).

E por último, temos Tomoyuki Kunii (國井智行) como diretor-chefe de fotografia pelo Studio Hibari (スタジオ雲雀), responsável por liderar a equipe que vai unir todos os elementos produzidos utilizando filtros, movimentos de câmera e diversas outras técnicas, com o intuito de que todos os elementos produzidos até então se unam de forma coesa e harmônica no produto final.

 

Animação do longa

Em relação à animação de Black Clover em geral, não é nenhuma surpresa que o animê seja altamente inconsistente devido às condições precárias da produção — apesar disso, a equipe ainda conseguia ocasionalmente entregar episódios grandiosos e repletos de excelentes sequências de ação!

Não foi diferente com Mahou Tei no Ken, onde Tanemura e sua equipe conseguiram entregar um filme genuinamente excelente! Mesmo que tenha passado por algumas complicações e possua algumas inconsistências em relação a sua animação aqui e ali, gerando um atraso na sua produção e um adiamento de três meses.

imagem: mãos corrigindo arte do filme.

Correção pela designer de personagens e diretora-chefe de animação, Itsuko Takeda (竹田逸子).

As expectativas para o filme eram grandes, principalmente para os fãs do animê, já que essa seria a grande chance da equipe: o Black Clover que todos conheciam, agora com cronograma e orçamento de um filme! Pessoalmente, minha expectativa era bem moderada; que o filme estaria a par de alguns dos melhores episódios da série — como os episódios 93 e 100 — em relação à qualidade da sua animação, mantendo aquele nível através de toda a sua duração. Principalmente depois que rumores sobre problemas começaram a surgir.

Baseando-se na reação do público, é fácil dizer que o filme conseguiu ultrapassar as expectativas até mesmo dos fãs mais otimistas, inclusive as minhas.

A animação do longa é, de fato, excelente! Mesmo ainda com algumas inconsistências em determinados pontos, para um filme que beira duas horas de pura ação, as sequências de ação não são só muito bem animadas, como também contam com direção e supervisão ótimas. Forte animação de efeitos e até alguns bons momentos de character acting em meio a ação.

Todos os animadores envolvidos fizeram um trabalho impressionante, entregando algumas das melhores, mais elaboradas e mais ambiciosas sequências de animação da série. Então, vamos conferir alguns dos principais destaques da animação.

imagem: screenshots de 4 cenas com close em rostos de personagens.

Reprodução.

Começando pelo Riooo, animador estrangeiro que fez sua estreia em Black Clover no episódio 93, rapidamente se mostrando excepcional, virando um talento de grande importância para a série, e entrando como um animador de ação de forma frequente nos anos seguintes. O filme lhe apresentou a sua maior oportunidade até agora, dando a ele a função de diretor de animação de ação —m esmo que não esteja oficialmente creditado assim, apenas como animador-chave.

Riooo foi responsável por corrigir e animar diversas cenas ao longo do filme. Isso é até então algo incomum, um animador estrangeiro assumindo um papel de tamanha importância. No entanto, dada a direção que a indústria de animação japonesa tem seguido nesses últimos anos, adotando cada vez mais o trabalho de animadores estrangeiros, a prática deve se tornar cada vez mais comum.

 

Não é só a animação de ação e efeitos que se destaca ao longo do filme, também há alguns poucos momentos onde a animação de atuação de personagens — character acting — brilha em meio a toda a ação que compõe a maior parte do longa. É aqui que eu quero destacar o animador e diretor de animação Takaya Sunagawa (砂川貴哉).

Foi uma ótima surpresa quando Sunagawa anunciou no Twitter que ele iria participar da produção, isso porque ele havia se acidentado durante a série, e se ausentou da equipe em 2020, mesmo que tenham mantido seu nome nos créditos de abertura até o final. Ele pode ter tido um papel reduzido no filme, mas é um alívio ver que Sunagawa passa bem, e que possivelmente ele esteja aos poucos voltando à ativa.

 

Uma das características mais marcantes de Black Clover é a utilização de animadores estrangeiros dos mais diferentes níveis de experiência, muitos que nunca haviam trabalhado em uma animação japonesa antes. Consequência de necessidade, mediante a uma escassez de recursos e apoio devido do seu próprio estúdio, Yoshihara e sua equipe de assistentes de produção recorreram ao Twitter em busca de animadores amadores ou iniciantes que estivessem dispostos a trabalhar sob os cronogramas apertados da série. E foi assim que o episódio 63 marcou um ponto de virada para o animê.

Mesmo como fruto de uma necessidade, isso acabaria se tornando um dos fatores mais marcantes da adaptação, e uma de suas principais forças nos anos seguintes. No filme não foi diferente, uma vez que esses animadores estrangeiros continuam sendo um dos principais alicerces da animação do longa. Vários animadores que já haviam participado de episódios anteriores do animê marcaram presença no filme, além de diversos novos animadores da web que fizeram sua estreia na produção do longa.

imagem: conrad leto em cena do filme.

Reprodução.

Temos por exemplo Hideki Hamazaki (濱﨑秀樹), um animador independente que ainda era um estudante quando participou pela primeira vez de Black Clover sob o pseudônimo HAHI, se tornando praticamente um regular da produção desde a sua primeira aparição na terceira abertura do animê.

Temos também o já citado Riooo, que fez sua estreia no episódio 93 e agora atua como diretor de animação de ação no filme, corrigindo e animando várias sequências de ação! Tillfining e 0nepeach, dois animadores independentes que tem trabalhado ocasionalmente no anime desde os episódios 49 e 59, respectivamente.

E além dos parceiros de longa data do animê, também temos uma leva de animadores mais recentes, como Dorian COULON, EVAKOI, Mitchell Gonzales, Rondeseo, Yuugen RB, Jordan Rear e FASTO, que trabalharam nos episódios finais do anime — 167 e 170 — entregando diversas sequências de ação ao longo do filme.

Enquanto que animadores estrangeiros associados a produção de Black Clover sempre foram um dos principais alicerces do animê, e agora também do filme, não se pode deixar de destacar que a capacidade da equipe de recrutar animadores veteranos de renome não deixou a desejar. Temos uma line-up interessante de animadores aqui que nunca haviam participado da série — e que francamente, era difícil de imaginar que veriamos alguns desses nomes em Black Clover.

imagem: personagem de black clover em filme (parece o conrad leto).

Reprodução.

Temos uma forte presença do sensasional Masaaki Endo (遠藤正明) ao longo do filme, entregando algumas das melhores sequências de animação de ação e animação de efeitos do longa. Como principal destaque temos a batalha entre Noelle e os Touros Negros contra Edward.

Ainda falando sobre animação de efeitos, também temos que destacar a importante presença do grande Kazunori Ozawa (小澤和則) como diretor de animação de efeitos do filme, animando e corrigindo efeitos ao longo de diversas cenas do filme — esses foram os que tiveram participações mais predominantes no filme.

Já em relação a participações mais breves, temos alguns a destacar também. Se precisa de um animador versátil para animar um ataque decisivo, você sempre pode contar com Shuu Sugita (杉田柊); contribuindo na luta entre Asta e Conrad, trazendo seus explosivos frames de impacto e efeitos.

 

Claro que também não pode faltar o grande freelancer Hironori Tanaka (田中宏紀); animando o golpe final, que mesmo sendo uma contribuição curtinha no clímax do filme, fico feliz que ele tenha passado por Black Clover. Kaito Tomioka (富岡海任) também contribuiu para a animação-chave do confronto final, animando a ascensão de Conrad ao seu desesperado ataque final, o Portal da Perdição.

 

A presença de Takeshi Maenami (前並武志) também foi uma enorme surpresa, trazendo sua perícia e energia ao animar as sequências de ação corpo a corpo na batalha entre Mereoleona e Princia, com suas poses e smears exageradas, sem falar no seu timing impactante. Outra participação que me pegou de surpresa foi a de Masashi Kudo (工藤昌史) — designer de personagens de Bleach e Bleach: Thousand-Year Blood War —, animando uma excelente sequência de atuação com Conrad durante o derradeiro clímax do filme.

Para lidar com tantos animadores distintos, é necessário uma boa equipe de diretores de animação, e esse é outro aspecto no qual o filme se sobressai, dado que o trabalho de supervisão de animação é excelente! Esses diretores de animação têm a função de supervisionar e corrigir os desenhos; caso se mostre necessário, corrigir a própria animação.

imagem: asta e personagem feminina em filme.

Reprodução.

Itsuko Takeda (竹田逸子), Kosei Takahashi (高橋恒星) e Kumiko Tokunaga (徳永久美子) assumiram o papel de diretores-chefe de animação, com a dupla Shunji Akasaka (赤坂俊士) e Takaya Sunagawa (砂川貴哉) também merecendo o devido destaque por seu fantástico trabalho como diretores de animação em determinados pontos-chave do filme.

imagem: mão com lápis em cima de desenho de personagem.

Correção pela designer de personagens e diretora-chefe de animação, Itsuko Takeda (竹田逸子).

Como podem ver, é fácil dizer que a adaptação de Black Clover raramente esteve assim tão bem animada, tão bem acabada, e tão consistente quanto em A Espada do Rei Mago!

 

Direção e Storyboard

Parte do charme e carisma da série sempre foi a sua diversidade e expressividade em meio às suas condições adversas. Black Clover buscava elevar a ação da obra original ao máximo do seu potencial, um traço característico que acredito ter sido principalmente herdado da visão de Tatsuya Yoshihara como seu diretor original, apresentando sequências de ação portando um escopo grandioso e que não têm nenhum receio de serem consideradas experimentais.

Tanemura foi seu diretor-assistente por anos, e é óbvio que a visão de Yoshihara para o animê — apesar de todas as complicações — continua firme, mesmo com Tanemura agora no comando da série (apesar de Yoshihara também ter sido um dos diretores de unidade do filme). Mas afinal, quem é o diretor desse filme, quem é Ayataka Tanemura? E os outros dois diretores envolvidos nesse filme?

imagem: asta machucado com curativos em cena, na frente de uma garota de olhos vermelhos.

Reprodução.

Um animador e eventualmente diretor pelo estúdio Mouse (マウス), Ayataka Tanemura (種村綾隆) tem atuado na indústria ao longo da última década. Tanemura começou sua carreira atuando como um animador-chave secundário, e depois virou animador-chave em diversas produções através da indústria como funcionário do estúdio Mouse, um grande estúdio de terceirização atualmente.

Em 2016 ele teve sua primeira oportunidade de atuar como diretor de episódio na produção de D.Gray-man Hallow; seguido por Time Bokan 24 ainda no mesmo ano. Ao longo da produção de Black Clover, o estúdio Mouse seria (não oficialmente) o estúdio de terceirização mais importante para o animê, com Tanemura sendo responsável por comandar os episódios produzidos no estúdio.

Com a chegada do terceiro trimestre de exibição do animê, Ayataka Tanemura seria promovido ao cargo de diretor-assistente da série a partir do episódio 28, e continuaria encarregado dos episódios produzidos no Mouse até o #153, quando ele se tornaria o diretor interino da série pelos seus quatro meses restantes.

imagem: foto de storyboards de black clover.

Storyboards de Black Clover: A Espada do Rei Mago, por Ayataka Tanemura (種村綾隆), Isuta Meister (椅子汰) e Tatsuya Yoshihara (吉原 達矢).

Durante o primeiro ano do animê, mesmo antes de se tornar diretor assistente, Tanemura continuou realizando alguns trabalhos por fora como diretor de episódios em obras como Devils’ Line (2018) e DEVILMAN Crybaby (2018), mas, durante os próximos anos após sua promoção, ele permaneceria focado somente em Black Clover até a eventual “conclusão” em março de 2021.

Após o fim da série, Tanemura continuaria participando de alguns poucos projetos, ainda atuando como diretor de episódio em séries como Umamusume Pretty Derby T2 (2021) e The Idaten Deities Know Only Peace (2021), permanecendo fora do radar até o anúncio de que ele seria diretor-assistente em Fuuto PI (2022), animê que comemora os 50 anos da franquia tokusatsu Kamen Rider. Em seguida, seu foco se voltou à direção do filme de Black Clover, como diretor geral da produção, diretor de unidade e artista de storyboard.

imagem: storyboard da cena inicial do filme.

Página do storyboard da cena de abertura do filme, por Ayataka Tanemura (種村綾隆)

Depois que a série chegou ao “fim”, o então diretor-chefe Tatsuya Yoshihara (吉原達矢) começou a atuar como animador em diversos outros projetos; muito se perguntava se ele continuaria atuando como diretor-chefe para o filme, mas quando foi confirmado que ele seria o diretor de animação de ação em Chainsaw Man pelo estúdio MAPPA, se tornou incerto se ele sequer estaria envolvido na produção do longa.

Bem, ele de fato teve uma participação considerável no filme, até mais do que muitos estavam supondo. Yoshihara atuou como diretor de unidade e artista de storyboard na porção final do filme, ao lado de Isuta.

imagem: ilustração yoshihara de personagem feminina do filme.

Ilustração em comemoração ao filme, por Tatsuya Yoshihara (吉原達矢). Vários animadores envolvidos na produção do longa fizeram artes comemorativas em uma contagem regressiva para a estreia do filme durante o mês de junho, é possível conferir todas elas no Twitter oficial da série.

Falando nele, Isuta (椅子汰) tem sido uma parte vital da produção de Black Clover: um dos principais animadores de ação da franquia, sendo responsável por animar diversas sequências de ação ao longo dos cinco anos de exibição da série; atuando também como diretor de animação de ação, corrigindo material entregue por outros animadores.

Isuta fez sua estreia como diretor de unidade em 2020, sendo responsável por desenvolver o storyboard e dirigir a primeira metade do episódio 118, com Tanemura comandando a segunda metade. Isuta mostrou que não só tinha talento para animar, mas também dirigir suas próprias cenas de ação. Posteriormente, Isuta ficaria encarregado do storyboard e a direção da 11ª abertura, e em seguida ele se tornaria diretor de unidade interino, dirigindo o episódio 151 sozinho.

imagem: asta segurando uma espadinha e uma espadão em cena com avermelhada.

Reprodução.

É realmente interessante ver como o principal animador de ação da franquia, não participou da animação-chave do filme. Dessa vez, ele focou seus esforços exclusivamente na função de diretor de unidade. Junto ao atual diretor da série, Ayataka Tanemura e o ex-diretor-chefe, Tatsuya Yoshihara; Isuta foi responsável por desenvolver storyboards em todos os três atos do filme e dirigiu o clímax junto com Yoshihara.

 

Cenários e composição

Pode-se dizer que o trabalho de direção de arte por Yuki Maeda (前田有紀) sempre foi visto como questionável dentro da série, principalmente devido ao quão simplórios são os backgrounds da adaptação em geral, apesar de existirem de fato cenários genuinamente muito bons ao longo do animê. Essa inconsistência ainda perdura no filme, e podemos encontrar os mesmos cenários amplos e paisagens vastas, porém totalmente vazias, mas ao mesmo tempo, também temos cenários que quando somados a uma boa composição, criam vistas estonteantes!

imagem: colagem com 4 cenas do filme.

Reprodução.

Os backgrounds para o filme ficaram novamente nas mãos do Studio Easter (スタジオイースター) — responsável pelos cenários do animê —, em parceira com o estúdio MOA studio.

imagem: colagem com 6 cenas do filme.

Reprodução.

O trabalho da equipe de composição liderada por Tomoyuki Kunii (國井智行), diretor de fotografia do projeto, é sem dúvidas um dos aspectos mais problemáticos e inconsistentes de todo o filme. Temos diversos momentos em que os elementos que compõem algumas cenas, simplesmente não se encaixam devidamente. Criando um visual plano e causando uma sensação de estranheza, dando a sensação de que os personagens e o cenário não coexistem; que estão simplesmente flutuando sobre uma imagem plana. Isso é algo que quebra a imersão no que você está vendo.

imagem: colagem com 4 cenas do filme (todas no coliseu).

Reprodução.

Dado que o podemos claramente ver o trabalho de fotografia do filme evoluindo drasticamente a cada novo trailer que era lançado, pode-se se supor que essa inconsistência “agressiva” na composição do filme, tenha sido causado pelo simples fato de que, talvez alguns cortes simplesmente tiverem consideravelmente menos tempo para que a equipe pudesse trabalhar nelas?!

 

Por outro lado, também temos momentos nos quais o trabalho estético feito pela equipe de composição conseguiu ser estonteante, elevando o visual de algumas cenas de forma majestosa! Geralmente no animê para TV só tínhamos um trabalho de composição assim tão forte em suas incríveis aberturas.

imagem: colagem com 4 cenas do filme, todas no céu ou com um céu no fundo.

Reprodução.

A composição do filme foi feita mais uma vez pelos mesmos estúdios responsáveis pela composição do animê: Studio Hibari (スタジオ雲雀) e Assez Finaud Fabric, em parceria com o estúdio Typhoon Graphics (颱風グラフィックス), que se juntou ao esforço de composição, auxiliando durante o clímax do filme.

O estúdio STEREOTYPE, responsável pela composição visual das aberturas do animê, produziu a sequência de encerramento apresentada nos créditos finais, além de montion graphics usados ao longo do filme; novamente sob o comando de Masashi Itou (伊東正志).

Não necessariamente do filme, mas o videoclipe da música tema “Here I Stand”, pelo grupo coreano TREASURE, também tem alguns cortes inéditos, com um ótimo trabalho de composição supervisionado por Tomoyuki Kunii. Na verdade, essas cenas nem sequer são do filme, e sim relacionadas à continuação do arco de Spade, o qual o animê parou na metade. Não que isso seja qualquer indício de que ele vá voltar.

imagem: colagem com mais 6 cenas do filme.

Reprodução.

Existem muitos momentos em que o trabalho de composição do filme é falho, e um desses principais momentos é quando eles estão lidando com elementos 3D — um aspecto que sempre foi que sempre problemático na série e ainda continua sendo no filme é o CGI produzido pelo estúdio SHiiTAKE DiGiTAL (しいたけデジタル). O longa faz utilizações interessantes de 3DCGI na composição de algumas de suas sequências de ação, mas assim como no animê, o trabalho feito pela equipe de CGI da SHiiTAKE DiGiTAL continua resultando em algo bastante incongruente.

imagem: coliseu em cena de black clover.

Reprodiução.

Outro aspecto negativo da composição — não exclusivamente de Black Clover — é como, em certos momentos, o trabalho feito pela equipe de composição se sobrepõem demais em relação à animação, principalmente quando se trata da animação de feitos. A composição às vezes é tão pesada em cima da animação, que ela oculta a riqueza de detalhes dos desenhos originais dos animadores.

imagem: comparativo entre rascunho e execução final.

Reprodiução.

Com tudo isso dito, honestamente, talvez uma mudança na direção de arte e na direção de fotografia, seja algo benéfico, qual o anime de fato precise? Difícil dizer ao certo.

 

O impacto mundial d‘A Espada do Rei Mago

Mas e aí, qual o impacto do filme? Se você também é fã da obra original, devia estar torcendo pelo sucesso do filme, já que poderia ser um fator decisivo para o retorno do animê. E agora que já falamos sobre o excelente resultado técnico da produção, porque não comentar um pouco sobre o resultado comercial do filme ao redor do mundo?

imagem: arte conceitual do jester.

Design sheets de Jester, por Itsuko Takeda (竹田逸子).

Black Clover: A Espada do Rei Mago fez sua estreia mundial no dia 16 de junho, contando com uma exibição limitada nos cinemas japoneses, acompanhado por um lançamento global através da plataforma de streaming Netflix. E pode-se dizer com toda certeza que o filme de Black Clover foi um grande sucesso para a plataforma de streaming, que convenhamos, não tem um histórico muito bom quando o assunto são animês.

A Espada do Rei Mago conseguiu se manter entre os três programas mais assistidos da plataforma mundialmente durante o seu fim de semana de estreia. Aqui no Brasil, por exemplo, ele estreou como o 3º filme mais assistido no território nacional; mantendo essa posição durante todo o final de semana de 16 a 18 de junho.

De acordo com os números divulgados pela própria Netflix, o filme teve 6,4 milhões de visualizações no seu primeiro fim de semana, somando um total de 10,5 milhões de visualizações com 12 dias em exibição na plataforma. Enquanto que em sua exibição limitada — exclusivamente — nos cinemas japoneses, o filme arrecadou um total de 107 mihões de ienes (cerca de 740 mil dólares americanos) ao final de sua primeira semana em cartaz. Pode-se dizer que foi um sucesso ao redor do globo, principalmente para plataforma de streaming. Se o animê retornar, será que Black Clover poderá encontrar uma nova casa na Neflix?

 

Considerações finais

Apesar de complicações enfrentadas pela equipe durante a produção, é inegável que Black Clover: Mahou Tei no Ken (Black Clover: A Espada do Rei Mago) é sensacional. Um filme ambicioso, cheio de ótimas ideias e um evidente carinho que a equipe tem pelo projeto, buscando trazer à tona o melhor de Black Clover.

É uma verdadeira carta de amor à obra de Yuki Tabata, apresentada através de uma direção que eleva o nível de cada cena, somada a uma equipe de animadores que conseguiram entregar incríveis sequências de ação, esbanjando toda a diversidade e expressividade que já fazem parte do charme da animação da série.

imagem: mão com lápis em cima de desenho do asta.

Correção pela designer de personagens e diretora-chefe de animação, Itsuko Takeda (竹田逸子).

É de fato incrível ver o que eles conseguiram criar com esse filme, dado as condições conturbadas que normalmente são associadas a essa produção. Como fã da obra original e alguém que tem torcido por essa equipe desde o começo, tenho somente palavras de agradecimento para Tanemura e toda a equipe.

Depois de todo esse papo, sem mais delongas, aqui se encerra mais uma edição do Sakuga no Hanashi! Mais uma vez, espero que a leitura tenha sido útil para os leitores.

Até a próxima!

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