Atenção: o texto a seguir contém spoilers do sexto e do sétimo episódios de “Digimon Adventure:”.


Anteriormente, em Digimon Adventure: (gravado assim mesmo, com os dois pontos): os digiescolhidos enfrentaram as dificuldades de uma cadeia alimentar digital, com predadores bem maiores e mais ferozes utilizados como peões dentro do jogo que começa a se desenhar. Isso tudo com bastante foco no lore e pouca atenção para o desenvolvimento de personagens, coisa que melhorou bastante em um dos episódios das duas últimas semanas.

 

No sexto episódio, Mimi…

Ainda naquele esquema pré-disposto de refazer o que aconteceu no animê original de 1999, utilizando os mesmos personagens e motivações dentro de um trama, mas com pontos de execução diferentes, o sexto episódio, como era de se esperar, trouxe a quinta relação entre uma digiescolhida e sua digimon: MimiPalmon, duas das melhores nessa franquia. E ainda que não sejam de suma importância dentro da escadinha de protagonistas, sempre agradaram este aqui que vos escreve por servirem comédia (voluntária e involuntária) no tanto de, ahn, “drama” que Digimon sempre se agarrou.

A Mimi é daquelas personagens que rendem muita pauta, possuindo uma porção de camadas que, quando bem desenvolvidas, garantem entretenimento em tela ao espectador. Vestindo o estereótipo de uma menina rica, mimada, que acredita ter o mundo a seus pés, suas hilárias características burguesas são bem representadas tanto visualmente (vestidão country vermelho, capelão, bolsa mais adulta), quanto roteiristicamente, carregando uma porção de linhas de diálogo e situações onde seu desnivelamento abastado é posto em cheque. E isso sempre gera momentos divertidíssimos de assistir…

…como esse dela recebendo os demais digiescolhidos em seu trono de folhas (que parece bastante desconfortável), agindo como uma rainha na vila das Tanemon, com a Palmon sendo sua emissária. Esse é o tipo de “bobagem Mimi” que faz valer sua presença dentro do ecossistema de digiescolhidos, funcionando como alivio cômico pontual capítulo a capítulo, além de eventualmente render tramas principais excepcionais. Lembro que, no animê de 1999, isso foi bem utilizado com ela atraindo a atenção de um bando de Numemon nojentos do esgoto, apaixonados por sua beleza e ajudando-a a enfrentar o temível, embora adorável, Monzaemon na cidade dos brinquedos.

A pena é que, pela preferência do roteiro em tocar a trama toda pra frente em vez de desenvolver individualmente cada personagem, sua participação não foi tão eloquente quanto poderia ser. Ela ainda foi o fio principal, eu sei. E sem sua atitude inflexível de continuar na vila para proteger as Tanemon (ou governar o lugar com todas as mordomias que isso acarretaria, encarem como preferir), explicar o lance de o Digimundo correr num tempo mais lento que o mundo real seria bem menos natural, visto essa ser uma boa maneira de inserir um conflito de urgências na história (salvar Tóquio de um apagão versus salvar a vida dum grupo de digimons, escolham o mais importante). Mas a impressão final é que tudo meio que foi pano de fundo para que o Taichi (Tai) digievoluísse o Greymon novamente, tomando vários segundos em tela com aquela animação impressionantemente bonita, mas que bem poderia ser melhor compartilhada entre os demais digimons.

Na real, o animê como um todo está mal dividido, sendo Taichi demais para digiescolhidos de menos. Felizmente, isso melhora bastante logo em seguida…

 

No sétimo episódio, finalmente, desenvolvimento de personagem

Enfim fechando a primeira rodada de apresentações, temos aqui a introdução de Joe, o sexto digiescolhido, ao lado de seu parceiro aquático, Gomamon. Já da história original, Joe se mostrava um personagem interessante de acompanhar: um pouco mais velho que os outros, cheio daquelas noias de adolescentes japoneses intrigados pelo futuro, por buscar resultados e afetados pelo excesso de cobrança por sucesso que a sociedade coloca sobre seus ombros. Meu segmento predileto com ele é quando, no segundo filme da franquia, Digimon Adventure: Our War Game!! (de 2000, o que corresponde à segunda parte da adaptação americana em longa-metragem), os demais digiescolhidos não podem contar com sua presença para derrotar a ameaça do Kuramon/Diaboromon, pois ele está ocupado demais fazendo uma prova.

Além disso, Joe também servia como uma âncora de maturidade em sensatez em meio a tantas personalidades fortes e perigosamente descuidadas no grupo. No episódio original de evolução do Gomamon para Ikkakumon, por exemplo, ele precisa resolver uma discussão entre o Taichi e o Yamato (Matt) sobre o grupo seguir ou não para um determinado local, com o primeiro deles não se importando com os riscos que podem sofrer e o outro, mais cuidadoso, querendo fugir do perigo, mas impossibilitando, assim, que eles consigam mais informações que serão úteis dali pra frente. No fim, Joe decide ir sozinho para não colocar os demais em problemas – embora essa seja uma decisão bem questionável, mas se apeguem ao simbolismo e não aos detalhes mais realistas.

Corta para 2020, com Digimon Adventure: mandando bem em questões técnicas (a animação segue maravilhosa, fluida e cheia de momentos impressionantes), mas só acertando de verdade na abordagem de um personagem agora, com o Joe. Esse sétimo episódio foi o primeiro nesse reboot perfeito em todos os sentidos. A introdução do Joe, com os demais personagens o encontrando estudando, e ele sequer percebendo a presença deles por alguns momentos, é bastante, digamos, “Joe”. Sua representação de arquétipo foi bastante detalhada, com uma porção de cenas demonstrando o quão fissurado com os estudos e assustado com um possível fracasso ele é. Ele literalmente bate a cabeça para se castigar, deixando escapar as cobranças que deve sofrer internamente por vir de uma família de médicos e precisar abrir mão de ser verão para conseguir uma nota alta num vestibular para o… ensino médio!

Mas quando o Gomamon é atacado, a amizade que ele construiu com o monstrinho digital é mostrada através de flashbacks, com eles alimentando uma relação de compreensão mútua e confiança (bem mais pela parte do digimon, claro) naqueles poucos dias. E aí, ainda sobre tempo para ação, e lutas, e explosões, e digievoluções (embora a do Agumon, novamente, seja a de maior destaque), e gags visuais da Mimi. É sempre bom contar com gags visuais da Mimi. E quem diria que o ataque de peixes marchantes renderia cenas estiticamente tão bonitas em tela? Eu que não.

No próximo, enfim o Koushiro (Izzy) chegará ao digimundo e o Yamato reaparecerá, no que deve ser o “episódio da mansão” dessa temporada. Estou ansioso para ver como introduzirão o Devimon na jogada, se Leomon dará as caras e como tudo isso conversará com o Takeru (TK), que ainda está em Tóquio junto com a Hikari (Kari).


Com transmissão simultânea ao Japão por aqui através da CrunchyrollDigimon Adventure: é um reboot do animê original de mesmo nome (mas sem os dois pontos), produzido pela Toei Animation, em 1999. Assista aqui.

Sinopse pela Crunchyroll:

É o ano de 2020. A Rede tornou-se algo indispensável para a vida dos humanos. Mas o que eles não sabem é que, por trás da Rede, existe um mundo de luz e trevas conhecido como o Mundo Digital, habitado pelos Digimons. Quando Taichi Yagami tenta salvar sua mãe e sua irmã, que estão a bordo de um trem desgovernado, ele entra na plataforma… e um estranho fenômeno o leva para o Mundo Digital. Ele e outros Digiescolhidos encontram seus parceiros Digimons e embarcam numa aventura em um mundo desconhecido!

O roteiro é assinado por Atsuhiro Tomioka, que já trabalhou em várias séries infantis como BuckyHamtaroSuper Onze Pokémon. No Japão, o animê substitui o horário de GeGeGe no Kitarou na FujiTV, série que se encerrou ao fim da última temporada de inverno japonesa e também foi exibida por aqui pela Crunchyroll.